Entrevista com o cineasta Silvio Tendler, realizada dia 25 de novembro, na sua visita a Juiz de Fora para a exibição e debate do seu filme no Encontro de Blogueiros Progressistas. Ele discorre sobre a importância das utopias para a produção artistica; das lições que a história nos deu; Da importância da arte alternativa para a renovação artistica do país; E também da genialidade do grande Galuber Rocha.
AS DIONIZÍACAS DE 17 a 20 no TEATRO DE ESTÁDIO do ex-ESTACIONAMENTO do BAÚ da FELICIDADE serão dedicadas à luta pelos DIREITOS HUMANOS DE ELAINE CESAR E À LIBERDADE ARTÍSTICA VIOLADA PELA VARA DE FAMÍLIA DE SÃO PAULO
São 06:16. Acordei, apesar de estar exausto por excesso de trabalho pelos trabalhos de realizar meu maior desejo em 30 anos, de apresentar a partir de 6ª feira as DIONIZÍACAS no Teatro de Estádio que levantamos no Ex-Estacionamento do Baú da Felicidade mas não consigo dormir porque não estou mais suportando a ENORME INJUSTIÇA que a SOCIEDADE BRASILEIRA está cometendo com ELAINE CESAR, que neste momento está na UTI, correndo risco de vida.
Este caso não é diferente do de Sakineh no Irã, do de Lu Xiaobo na China e de Assange na Inglaterra. Vim pro computador porque até agora não conseguí fazer chegar nossas vozes de defesa aos DIREITOS HUMANOS desta Mãe Artista, Diretora de Video do Teatro Oficina Uzyna Uzona, que na semana passada, perdeu em duas jogadas:
1º, a guarda de seu filho THEO, de 3 anos de idade.
2º, seus instrumentos de trabalho confiscados, seus HD's, que também são do Oficina, com todo material gravado de pelo menos 30 anos de Oficina Uzyna Uzona, e de outros trabalhos seus, e de artistas como Tadeu Jungle.
É um atentado à liberdade de produção artística, um sequestro só comparável à invasão do CCC em 1968 a "Roda Viva".
E agora esta mulher está incapacitada de estar à frente do trabalho que adora, de comandar a direção de Video e das filmagens das Dionizíacas esta semana, e tem de ver a sociedade, a Mídia sempre tão escandalosa, impassível com este fato.
Porque tudo isso ?
Porque um ex-marido ciumento, totalmente perturbado, teve acolhidos por autoridades da Vara da Família, para esta praticar uma ação absolutamente anti-democrática, para não dizer nazista, todos seus pedidos mais absurdos de ex-marido ególatra, doente, de arrancar o filho do convívio da Mãe, acusando Elaine de trabalhar num "Teatro Pornográfico" e para lá levar o filho: o Teatro Oficina. Fez oficiais de justiça sequestrarem os HD's deste Teatro, com um texto de uma obscenidade rara, para procurar cenas de pedofilia e práticas obscenas que Elaine e seu atual marido, o ator Fred Stefen, do Teatro Oficina, teriam cometido com o filho de Elaine, o menino Theo.
Quase todas as 90 pessoas que trabalham na Associação Oficina Uzyna Uzona têm se manifestado por escrito, pois tiveram contato permanente com Theo, Elaine e Fred dentro do teatro e fora dele e não se conformam com a falta de eco de seus protestos.
Porque tudo isso ?
A revolução cultural da liberdade que uma grande parte dos seres humanos vem conquistando determina uma reação absolutamente inquisitorial, fascista, como é o caso dos homofóbicos da Av. Paulista e no caso, não do Estado Brasileiro, mas da própria Sociedade Reacionária incorformada, querendo novamente impor censura à Arte, aos costumes, e pior à vida dos que escolheram viver livremente o Amor.
E é incrível aqui, a liberdade de imprensa tão fervorosa em escândalos moralistas, se cala totalmente diante de um atentado a dois seres humanos, Elaine, a Mãe, e Theo seu filho, e a um teatro de 52 anos como o Oficina, e não toca no assunto, como se fosse o Partido Comunista Chinês, os Republicanos dos EEUU e os fundamentalistas islâmicos do Irã.
Tenho feito inúmeras reportagens sobre as DIONIZÍACAS, e falado no assunto, mas a divisão ainda tayloriana de trabalho impede que os jornalistas levem a sério o que estou dizendo, por não estar no limite das matérias que estão fazendo comigo.
Enquanto isso uma mulher, ELAINE CESAR, praticamente corre risco de vida na UTI e o Teatro Oficina censurado estreia as DIONIZÍACAS tendo por exemplo de fazer sua propaganda para a TV com material ainda filmadas no edifício do Teatro Oficina, pois as imagens do Teatro de Estádio erguido pelo Brasil em 2010 estão sequestradas pela Vara da Família.
O moralismo desta instiuição, que parece odiar os Artistas como criminosos, dá proteção a um macho ciumento, invejoso, doente, mordido de ciúmes, que está tendo delírios sexuais, projetando em ações discricionárias como as que tem praticado, e pior com apoio da injustiça.
Fazendo um ensaio corrido de BACANTES, que conta a história de Dionisios e da luta de seu adversário moralista, que quer impedir o culto do Teatro em sua cidade, percebi o óbvio. Tudo que Penteu acusa nas BACANTES e em DIONISIOS é projeção de coisas que seu ciúme provocou em sua cabeça.
Elaine, muito tempo depois que se separou deste ex-marido, teve o privilégio de encontrar um novo amor no ator Fred, que é homem muito bonito e muito livre. O macho, ex-Hare Krishna, ciumento, invejoso, então endoidou e começou a imaginar em sua cabeça cenas de pedofilia, sexo de Elaine e de seu novo maravilhoso amor com seu filho, repressão ao TEATRO OFICINA. Elementar, Freud diria.
Os desejos de pedofilia, até de pederastia em relação ao atual marido de Elaine estão nele. Por isso o menino de 3 anos Theo, corre perigo nas mãos deste irreponsável. Uma tia procuradora aposentada, de Brasília, rica, e um deputado devem estar auxiliando o rapaz com seus contatos reacionários aqui na Vara de Família.
Nem sei os nomes das pessoas porque os autos não estão na minha mão. Elaine não tem pai nem mãe, estão mortos. Fred está sem dormir há dias, agora preocupado acima de tudo com a sobrevivência de Elaine. Segunda feira havia uma audiência com o Juiz de família, para copiarmos o absurdo de mais de 400 horas de vídeo dos HD's. Nenhum de nós nem pôde aparecer, pois estávamos preocupados com a vida de Elaine, hospitalizada na UTI. Fred doi buscá-la no aereoporto, onde voltava de Brasília, para onde tinha ido ver o filho, sob a vigilância de uma babá contratada pela tia. Na despedida Theo o menino chorava, querendo voltar para os braços da mãe em São Paulo, segundo relato de Elaine, que do aeroporto, passando muito mal, teve de ser hospitalizada, e em estado grave o hospital resolveu colocá-la na UTI.
Não sei o que fazer para acordar a mídia, esta Justiça Injusta que, querendo defender a Família, destreoi a vida de uma Mãe, de uma Criança e atormenta todo nosso trabalho maravilhoso neste momento vitorioso do Oficina Uzyna Uzona. Este "taylorismo", (divisão de trabalho e competências do século 19) da vida contemporânea, esta insensibilidade aos direitos humanos que me é revelada agora neste momento, me faz dedicar as DIONIZÍACAS á todos que lutaram em 30 anos por este momento, mas sobretudo a ELAINE CESAR E THEO.
Que esse filho volte imediatamente para os braços da MÃE antes que aconteça o PIOR.
E que o material apreendido retorne imediatamente ao Oficina Uzyna Uzona.
É uma Obra de Arte sequestrada em nome de uma atitude mesquinha provocada pelo Ciúme de um Ególatra, de uma Justiça cega e de uma Sociedade, Mídia, conivente como a de São Paulo.
Por favor acordem os trabalhadores da difusão do que acontece de bom e de mau no Mundo e revelem isso a todos. Peço a todos, seja quem for, que façam esse favor de amor aos direitos humanos e batam seus tambores.
Me dirijo especialmente a Ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire. Médica, Professora da UFRJ, Nilcéa ocupa o Ministério há quase 8 anos. Tem feito um excelente trabalho. O endereço da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República é: Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Edifício Sede, 2º andar – Brasília/DF. CEP: 70047-900. Fones: (61) 2104 – 9377 e 2104 – 9381. Faxes: (61) 2104 – 9362 e 2104 – 0355.
A OTAVIO FRIAS, na FOLHA, aos diretores do ESTADÃO, do GLOBO, das TV'S, Rádios, que apurem os fatos. Nós estamos envolvidos nos trabalhos de estrear dia 17 as DIONIZÍACAS, um marco na história do TEATRO MUNDIAL, e nos sentimos impotentes diante da gravidade do assunto, de uma VIDA HUMANA CORRENDO O RISCO, POR SEUS SENTIMENTOS DE DIREITOS HUMANOS TEREM SIDO AGREDIDOS.
Colaborem conosco, estamos sobrecarregados dos trabalhos das DIONIZÍACAS, mas não podemos parar pois é a ARTE somente que temos para dar Vida a Elaine nestes dias.
José Celso Martinez Corrêa
14 de dezembro de 2010, 07:40
MERDA
São 06:16. Acordei, apesar de estar exausto por excesso de trabalho pelos trabalhos de realizar meu maior desejo em 30 anos, de apresentar a partir de 6ª feira as DIONIZÍACAS no Teatro de Estádio que levantamos no Ex-Estacionamento do Baú da Felicidade mas não consigo dormir porque não estou mais suportando a ENORME INJUSTIÇA que a SOCIEDADE BRASILEIRA está cometendo com ELAINE CESAR, que neste momento está na UTI, correndo risco de vida.
Este caso não é diferente do de Sakineh no Irã, do de Lu Xiaobo na China e de Assange na Inglaterra. Vim pro computador porque até agora não conseguí fazer chegar nossas vozes de defesa aos DIREITOS HUMANOS desta Mãe Artista, Diretora de Video do Teatro Oficina Uzyna Uzona, que na semana passada, perdeu em duas jogadas:
1º, a guarda de seu filho THEO, de 3 anos de idade.
2º, seus instrumentos de trabalho confiscados, seus HD's, que também são do Oficina, com todo material gravado de pelo menos 30 anos de Oficina Uzyna Uzona, e de outros trabalhos seus, e de artistas como Tadeu Jungle.
É um atentado à liberdade de produção artística, um sequestro só comparável à invasão do CCC em 1968 a "Roda Viva".
E agora esta mulher está incapacitada de estar à frente do trabalho que adora, de comandar a direção de Video e das filmagens das Dionizíacas esta semana, e tem de ver a sociedade, a Mídia sempre tão escandalosa, impassível com este fato.
Porque tudo isso ?
Porque um ex-marido ciumento, totalmente perturbado, teve acolhidos por autoridades da Vara da Família, para esta praticar uma ação absolutamente anti-democrática, para não dizer nazista, todos seus pedidos mais absurdos de ex-marido ególatra, doente, de arrancar o filho do convívio da Mãe, acusando Elaine de trabalhar num "Teatro Pornográfico" e para lá levar o filho: o Teatro Oficina. Fez oficiais de justiça sequestrarem os HD's deste Teatro, com um texto de uma obscenidade rara, para procurar cenas de pedofilia e práticas obscenas que Elaine e seu atual marido, o ator Fred Stefen, do Teatro Oficina, teriam cometido com o filho de Elaine, o menino Theo.
Quase todas as 90 pessoas que trabalham na Associação Oficina Uzyna Uzona têm se manifestado por escrito, pois tiveram contato permanente com Theo, Elaine e Fred dentro do teatro e fora dele e não se conformam com a falta de eco de seus protestos.
Porque tudo isso ?
A revolução cultural da liberdade que uma grande parte dos seres humanos vem conquistando determina uma reação absolutamente inquisitorial, fascista, como é o caso dos homofóbicos da Av. Paulista e no caso, não do Estado Brasileiro, mas da própria Sociedade Reacionária incorformada, querendo novamente impor censura à Arte, aos costumes, e pior à vida dos que escolheram viver livremente o Amor.
E é incrível aqui, a liberdade de imprensa tão fervorosa em escândalos moralistas, se cala totalmente diante de um atentado a dois seres humanos, Elaine, a Mãe, e Theo seu filho, e a um teatro de 52 anos como o Oficina, e não toca no assunto, como se fosse o Partido Comunista Chinês, os Republicanos dos EEUU e os fundamentalistas islâmicos do Irã.
Tenho feito inúmeras reportagens sobre as DIONIZÍACAS, e falado no assunto, mas a divisão ainda tayloriana de trabalho impede que os jornalistas levem a sério o que estou dizendo, por não estar no limite das matérias que estão fazendo comigo.
Enquanto isso uma mulher, ELAINE CESAR, praticamente corre risco de vida na UTI e o Teatro Oficina censurado estreia as DIONIZÍACAS tendo por exemplo de fazer sua propaganda para a TV com material ainda filmadas no edifício do Teatro Oficina, pois as imagens do Teatro de Estádio erguido pelo Brasil em 2010 estão sequestradas pela Vara da Família.
O moralismo desta instiuição, que parece odiar os Artistas como criminosos, dá proteção a um macho ciumento, invejoso, doente, mordido de ciúmes, que está tendo delírios sexuais, projetando em ações discricionárias como as que tem praticado, e pior com apoio da injustiça.
Fazendo um ensaio corrido de BACANTES, que conta a história de Dionisios e da luta de seu adversário moralista, que quer impedir o culto do Teatro em sua cidade, percebi o óbvio. Tudo que Penteu acusa nas BACANTES e em DIONISIOS é projeção de coisas que seu ciúme provocou em sua cabeça.
Elaine, muito tempo depois que se separou deste ex-marido, teve o privilégio de encontrar um novo amor no ator Fred, que é homem muito bonito e muito livre. O macho, ex-Hare Krishna, ciumento, invejoso, então endoidou e começou a imaginar em sua cabeça cenas de pedofilia, sexo de Elaine e de seu novo maravilhoso amor com seu filho, repressão ao TEATRO OFICINA. Elementar, Freud diria.
Os desejos de pedofilia, até de pederastia em relação ao atual marido de Elaine estão nele. Por isso o menino de 3 anos Theo, corre perigo nas mãos deste irreponsável. Uma tia procuradora aposentada, de Brasília, rica, e um deputado devem estar auxiliando o rapaz com seus contatos reacionários aqui na Vara de Família.
Nem sei os nomes das pessoas porque os autos não estão na minha mão. Elaine não tem pai nem mãe, estão mortos. Fred está sem dormir há dias, agora preocupado acima de tudo com a sobrevivência de Elaine. Segunda feira havia uma audiência com o Juiz de família, para copiarmos o absurdo de mais de 400 horas de vídeo dos HD's. Nenhum de nós nem pôde aparecer, pois estávamos preocupados com a vida de Elaine, hospitalizada na UTI. Fred doi buscá-la no aereoporto, onde voltava de Brasília, para onde tinha ido ver o filho, sob a vigilância de uma babá contratada pela tia. Na despedida Theo o menino chorava, querendo voltar para os braços da mãe em São Paulo, segundo relato de Elaine, que do aeroporto, passando muito mal, teve de ser hospitalizada, e em estado grave o hospital resolveu colocá-la na UTI.
Não sei o que fazer para acordar a mídia, esta Justiça Injusta que, querendo defender a Família, destreoi a vida de uma Mãe, de uma Criança e atormenta todo nosso trabalho maravilhoso neste momento vitorioso do Oficina Uzyna Uzona. Este "taylorismo", (divisão de trabalho e competências do século 19) da vida contemporânea, esta insensibilidade aos direitos humanos que me é revelada agora neste momento, me faz dedicar as DIONIZÍACAS á todos que lutaram em 30 anos por este momento, mas sobretudo a ELAINE CESAR E THEO.
Que esse filho volte imediatamente para os braços da MÃE antes que aconteça o PIOR.
E que o material apreendido retorne imediatamente ao Oficina Uzyna Uzona.
É uma Obra de Arte sequestrada em nome de uma atitude mesquinha provocada pelo Ciúme de um Ególatra, de uma Justiça cega e de uma Sociedade, Mídia, conivente como a de São Paulo.
Por favor acordem os trabalhadores da difusão do que acontece de bom e de mau no Mundo e revelem isso a todos. Peço a todos, seja quem for, que façam esse favor de amor aos direitos humanos e batam seus tambores.
Me dirijo especialmente a Ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire. Médica, Professora da UFRJ, Nilcéa ocupa o Ministério há quase 8 anos. Tem feito um excelente trabalho. O endereço da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República é: Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Edifício Sede, 2º andar – Brasília/DF. CEP: 70047-900. Fones: (61) 2104 – 9377 e 2104 – 9381. Faxes: (61) 2104 – 9362 e 2104 – 0355.
A OTAVIO FRIAS, na FOLHA, aos diretores do ESTADÃO, do GLOBO, das TV'S, Rádios, que apurem os fatos. Nós estamos envolvidos nos trabalhos de estrear dia 17 as DIONIZÍACAS, um marco na história do TEATRO MUNDIAL, e nos sentimos impotentes diante da gravidade do assunto, de uma VIDA HUMANA CORRENDO O RISCO, POR SEUS SENTIMENTOS DE DIREITOS HUMANOS TEREM SIDO AGREDIDOS.
Colaborem conosco, estamos sobrecarregados dos trabalhos das DIONIZÍACAS, mas não podemos parar pois é a ARTE somente que temos para dar Vida a Elaine nestes dias.
José Celso Martinez Corrêa
14 de dezembro de 2010, 07:40
MERDA
Dzi
A Lennie Dale, Wagner Ribeiro, Wagner Mello, Cláudio Gaya, Cláudio Tovar, Ciro Barcelos, Reginaldo de Poli, Bayard Tonelli, Rogério de Poli, Paulo Bacellar, Benedictus Lacerda, Carlinhos Machado e Eloy Simões.
“E assim nas calhas de roda / Gira, a entreter a razão, / Esse comboio de corda / Que se chama coração.” Fernando Pessoa.
Salto alto...dançam as letras, dançam as palavras!
Dançam os costumes, dança a tradição!
Dançam os versos desta lavra!
Dançam ditadores e dançam tiranos,
Dançam os sonhos no coração!
Dançam os plebeus e soberanos!
Dança Chaplin segurando o Mundo!
Dançam os Dzi Croquettes!
Dançam os Censores num sono profundo!
Dançam tesouras e canivetes!
Dançam todos no Ton-Ton!
E as buzinas imprimem seu tenaz fon-fon!
Salto alto!... Contracultura!
Beco das Garrafas!
Dançam vampiros sobre as sepulturas!
Dessa dança ninguém se safa!
O Luxo do Lixo, ou o Lixo do Luxo?
A força do macho e a graça da fêmea...
Dançam os bruxos!
Danças 13 almas gêmeas!
Gente computada igual você!
Computada antes da Internet...
Computada com plumas e paetês!
Dançam trincando sabonetes e tabletes!
Tinindo trincando assim falou Zaratustra!
Dançam pelo Brasil e pela Europa!
Dançam sapatilhas e a cena lustra!
E os pés doloridos a ribalta de sangue ensopa!
Por Daniel Barbosa
Quando o assunto é ditadura militar, a classe artística brasileira sempre lamentou – e com razão – as mazelas do período negro, mas dificilmente lembrou de capítulos debochados e escrachados, brilhantes e coloridos que marcaram a história da nossa arte. No limbo de uma era de trevas ficaram as peripécias performáticas de Dzi Croquettes, grupo de teatro carioca que revolucionou os palcos do Brasil e da Europa com muita irreverência nos anos 70 e início da década de 80. Quase 30 anos depois das últimas apresentações, a trupe ganhou as telas de cinema com o documentário Dzi Croquettes, de Tatiana Issa e Raphael Alvarez.
Além de resgatar engenhosa manifestação cultural, os diretores apresentaram o grupo de 13 bailarinos e atores à nova geração, que, além de admirar a originalidade do Dzi, repete a intrigante pergunta: como eles conseguiram driblar a ditadura militar? E driblaram mesmo. Tanto que o drible é sustentado pela abertura do filme, que inicia com flashes do cenário político de 64 e o AI-5 de 1968, que boicotou aproximadamente 450 peças de teatro, 500 obras cinematográficas e 1000 letras de músicas. E o Dzi? Enquanto isso, o Dzi desfilava sua androginia em corpos torneados, peludos e purpurinados, sob luzes e refletores, envoltos em boás e mínimos trajes femininos, montados em saltos altos, coloridos por maquiagem pesadíssima, e com vozes afeminadas cantavam: “eu não tenho culpa de ser chique assim”.
Chiques? Para a censura, não. Mas quem era a tal censura? Eles não a conheciam. No inicio – e por um bom período – talvez os censores tivessem a mesma visão da menina Tatiana. Eram “palhacinhos”. Ou, numa conceituação mais predominante, o “Dzi” era um “bando de viado”. E o bando arrebatou hordas de tietes. Todos queriam ver Dzi Croquettes, todos queriam ser Dzi Croquettes. Dzi Croquettes virou estado de espírito e distinguiu momentos da contracultura e do desbunde brasileiro. Então o sistema entendeu que a seminudez dos corpos apocalípticos ia além do cômico, do farsesco e do grotesco. Com a “força do macho e a graça da fêmea” – slogan da trupe –, afrontavam as privações da época, tentavam explicar que “a vida é um cabaré”, como diz o “pai” da família Dzi Croquettes, o bailarino Lennie Dale, em trecho do filme. E o exílio levou-os a fazer o cabaré em Paris, onde conquistaram cartazes do show business, como as atrizes Lisa Minelli e a belle de jour, Catherine Deneuve, a cantora e atriz Josephine Baker, o estilista Valentino e, sobretudo, os palcos franceses. Provaram que eram “das internacionais”.
No filme, a trajetória da “família” Dzi Croquettes é narrada pela mescla de histórias de vida: as memórias da diretora – filha de Américo Issa, que trabalhou na equipe técnica do Dzi; por relatos biográficos – de artistas que acompanharam e tiveram o grupo como inspiração; e por depoimentos autobiográficos – dos últimos componentes Ciro Barcelos, Benedicto Lacerda, Cláudio Tovar, Bayard Tonelli e Reginaldo de Poly – já “viraram purpurina”, como diz a narrativa de Issa: Wagner Ribeiro, Cláudio Gaya, Roberto de Rodriguez, Paulo Bacellar (Paolette), Carlinhos Machado, Rogério de Poly, Eloy Simões e Lennie Dale.
A vida de Dale daria um filme à parte. Experiente nos palcos da Broadway, o bailarino deu maturidade artística ao grupo, renovou a dança no Brasil e revolucionou a música verde-amarela. Muito criativo e com mãos de ferro, o americano levava os parceiros a encenações magistrais que misturavam o teatro de vivências – o improviso atrelado às experiências do atores – ao musical. Fosse com a lancinante “Assim falou Zaratustra” (Strauss), ou com a animada “Tinindo trincando” (Novos Baianos) ou ainda com a sensualíssima “Dois pra lá, dois pra cá”, na voz de Elis Regina, o espetáculo não saia da linha do atrevimento.
O filme apresenta uma série de curiosidades. O Dzi Croquettes criou e também popularizou muitas expressões e termos usados pelo público gay, principalmente. “Tá boa, santa?”, “arrasa”, “adoro”, “rosetar”, “se jogar”, “rodar a baiana”, a palavra “amor” com o erre arranhado e arrastado – apesar dessa característica, o mote principal do Dzi não era fazer proselitismo a um grupo específico. A identidade sexual do grupo era definida com a frase: “Nem homem. Nem mulher. Gente”. Ou seja: “nem dama nem valete”, e sim dzi croquette. Mais que avaliações rotuladas, a trajetória dos 13 homens ensandecidos é vital à cultura brasileira, pois foram eles quem acenderam novas luzes no nosso teatro, cultivaram e moldaram outra forma de ser brasileiro e deram mais suavidade a uma época de ingratidão. O filme está aí pra contar a imprescindível história do Dzi Croquettes.
“E assim nas calhas de roda / Gira, a entreter a razão, / Esse comboio de corda / Que se chama coração.” Fernando Pessoa.
Salto alto...dançam as letras, dançam as palavras!
Dançam os costumes, dança a tradição!
Dançam os versos desta lavra!
Dançam ditadores e dançam tiranos,
Dançam os sonhos no coração!
Dançam os plebeus e soberanos!
Dança Chaplin segurando o Mundo!
Dançam os Dzi Croquettes!
Dançam os Censores num sono profundo!
Dançam tesouras e canivetes!
Dançam todos no Ton-Ton!
E as buzinas imprimem seu tenaz fon-fon!
Salto alto!... Contracultura!
Beco das Garrafas!
Dançam vampiros sobre as sepulturas!
Dessa dança ninguém se safa!
O Luxo do Lixo, ou o Lixo do Luxo?
A força do macho e a graça da fêmea...
Dançam os bruxos!
Danças 13 almas gêmeas!
Gente computada igual você!
Computada antes da Internet...
Computada com plumas e paetês!
Dançam trincando sabonetes e tabletes!
Tinindo trincando assim falou Zaratustra!
Dançam pelo Brasil e pela Europa!
Dançam sapatilhas e a cena lustra!
E os pés doloridos a ribalta de sangue ensopa!
Por Daniel Barbosa
Quando o assunto é ditadura militar, a classe artística brasileira sempre lamentou – e com razão – as mazelas do período negro, mas dificilmente lembrou de capítulos debochados e escrachados, brilhantes e coloridos que marcaram a história da nossa arte. No limbo de uma era de trevas ficaram as peripécias performáticas de Dzi Croquettes, grupo de teatro carioca que revolucionou os palcos do Brasil e da Europa com muita irreverência nos anos 70 e início da década de 80. Quase 30 anos depois das últimas apresentações, a trupe ganhou as telas de cinema com o documentário Dzi Croquettes, de Tatiana Issa e Raphael Alvarez.
Além de resgatar engenhosa manifestação cultural, os diretores apresentaram o grupo de 13 bailarinos e atores à nova geração, que, além de admirar a originalidade do Dzi, repete a intrigante pergunta: como eles conseguiram driblar a ditadura militar? E driblaram mesmo. Tanto que o drible é sustentado pela abertura do filme, que inicia com flashes do cenário político de 64 e o AI-5 de 1968, que boicotou aproximadamente 450 peças de teatro, 500 obras cinematográficas e 1000 letras de músicas. E o Dzi? Enquanto isso, o Dzi desfilava sua androginia em corpos torneados, peludos e purpurinados, sob luzes e refletores, envoltos em boás e mínimos trajes femininos, montados em saltos altos, coloridos por maquiagem pesadíssima, e com vozes afeminadas cantavam: “eu não tenho culpa de ser chique assim”.
Chiques? Para a censura, não. Mas quem era a tal censura? Eles não a conheciam. No inicio – e por um bom período – talvez os censores tivessem a mesma visão da menina Tatiana. Eram “palhacinhos”. Ou, numa conceituação mais predominante, o “Dzi” era um “bando de viado”. E o bando arrebatou hordas de tietes. Todos queriam ver Dzi Croquettes, todos queriam ser Dzi Croquettes. Dzi Croquettes virou estado de espírito e distinguiu momentos da contracultura e do desbunde brasileiro. Então o sistema entendeu que a seminudez dos corpos apocalípticos ia além do cômico, do farsesco e do grotesco. Com a “força do macho e a graça da fêmea” – slogan da trupe –, afrontavam as privações da época, tentavam explicar que “a vida é um cabaré”, como diz o “pai” da família Dzi Croquettes, o bailarino Lennie Dale, em trecho do filme. E o exílio levou-os a fazer o cabaré em Paris, onde conquistaram cartazes do show business, como as atrizes Lisa Minelli e a belle de jour, Catherine Deneuve, a cantora e atriz Josephine Baker, o estilista Valentino e, sobretudo, os palcos franceses. Provaram que eram “das internacionais”.
No filme, a trajetória da “família” Dzi Croquettes é narrada pela mescla de histórias de vida: as memórias da diretora – filha de Américo Issa, que trabalhou na equipe técnica do Dzi; por relatos biográficos – de artistas que acompanharam e tiveram o grupo como inspiração; e por depoimentos autobiográficos – dos últimos componentes Ciro Barcelos, Benedicto Lacerda, Cláudio Tovar, Bayard Tonelli e Reginaldo de Poly – já “viraram purpurina”, como diz a narrativa de Issa: Wagner Ribeiro, Cláudio Gaya, Roberto de Rodriguez, Paulo Bacellar (Paolette), Carlinhos Machado, Rogério de Poly, Eloy Simões e Lennie Dale.
A vida de Dale daria um filme à parte. Experiente nos palcos da Broadway, o bailarino deu maturidade artística ao grupo, renovou a dança no Brasil e revolucionou a música verde-amarela. Muito criativo e com mãos de ferro, o americano levava os parceiros a encenações magistrais que misturavam o teatro de vivências – o improviso atrelado às experiências do atores – ao musical. Fosse com a lancinante “Assim falou Zaratustra” (Strauss), ou com a animada “Tinindo trincando” (Novos Baianos) ou ainda com a sensualíssima “Dois pra lá, dois pra cá”, na voz de Elis Regina, o espetáculo não saia da linha do atrevimento.
O filme apresenta uma série de curiosidades. O Dzi Croquettes criou e também popularizou muitas expressões e termos usados pelo público gay, principalmente. “Tá boa, santa?”, “arrasa”, “adoro”, “rosetar”, “se jogar”, “rodar a baiana”, a palavra “amor” com o erre arranhado e arrastado – apesar dessa característica, o mote principal do Dzi não era fazer proselitismo a um grupo específico. A identidade sexual do grupo era definida com a frase: “Nem homem. Nem mulher. Gente”. Ou seja: “nem dama nem valete”, e sim dzi croquette. Mais que avaliações rotuladas, a trajetória dos 13 homens ensandecidos é vital à cultura brasileira, pois foram eles quem acenderam novas luzes no nosso teatro, cultivaram e moldaram outra forma de ser brasileiro e deram mais suavidade a uma época de ingratidão. O filme está aí pra contar a imprescindível história do Dzi Croquettes.
Caio F & Cazuza
“(...) Tão geladas as pernas e os braços e a cara que pensei em abrir a garrafa para beber um gole, mas não queria chegar na casa dele meio bêbado, hálito fedendo, não queria que ele pensasse que eu andava bebendo, e eu andava, todo dia um bom pretexto, e fui pensando também que ele ia pensar que eu andava sem dinheiro, chegando a pé naquela chuva toda, e eu andava, estômago dolorido de fome, e eu não queria que ele pensasse que eu andava insone, e eu andava, roxas olheiras, teria que ter cuidado com o lábio inferior ao sorrir, se sorrisse, e quase certamente sim, quando o encontrasse, para que não visse o dente quebrado e pensasse que eu andava relaxando, sem ir ao dentista, e eu andava, e tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era."
(Além do Ponto – Caio Fernando Abreu)
“O amor é o ridículo da vida. A gente procura nele uma pureza impossível. Uma pureza que está sempre se pondo, indo embora. A vida veio e me levou com ela. Sorte é se abandonar e aceitar essa vaga idéia de paraíso que nos persegue. Bonita e breve. Como borboletas que só vivem vinte e quatro horas. Morrer não dói.”
Cazuza
Soneto para Cláudia
Por Glauco Mattoso
Decennio foi aquelle bem anarcho, bem punk e marginal!
Na mixta scena, foi Claudia these e antithese: era antenna de generos e genios o seu barco!
Performer? Transformista? Quem foi Marco Antonio? Um travesti? Teve ella a plena imagem que se oppõe a quem condemna o "extranho", e com tal fardo eu também arco...
No lado mais selvagem do submundo urbano Claudia andou, cuspindo o mytho poetico: o "maldicto", o "vagabundo"...
Mas "gente é p'ra brilhar", e eu não me ommitto, embora cego: vejo o que, segundo Caetano, Claudia expoz... Brilho infinito!
Que sua luz continue a nos iluminar e nos proteger...
Para a tristeza de todos que conheceram, faleceu na manhã desta sexta-feira (26) a inesquecível Cláudia Wonder de uma estranha Doença do Pombo - que vem do fungo que surge quando as fezes dos pombos secam. Até na morte, Claudia não foi óbvia. Em um mundo cada vez mais redundante e politicamente correto, ela vai fazer muito falta...
Meu amigo Cláudia - Por Caio Fernando Abreu
Maravilha, prodígio, espanto:
No palco e na vida, meu amigo Cláudia é bem assim:
Meu amigo Cláudia é uma das pessoas mais dignas que conheço. E aqui preciso deter-me um pouco para explicar o que significa, para mim, “digno” ou “dignidade”. Nem é tão complicado: dignidade acontece quando se é inteiro. Mas o que quer dizer ser “inteiro”? Talvez, quando se faz exatamente o que se quer fazer, do jeito que se quer fazer, da melhor maneira possível. A opinião alheia, então, torna-se detalhe desimportante. O que pode resultar – e geralmente resulta mesmo – numa enorme solidão. Dignidade é quando a solidão de ter escolhido ser, tão exatamente quanto possível, aquilo que se é dói muito menos do que ter escolhido a falsa não-solidão de ser o que não se é, apenas para não sofrer a rejeição tristíssima dos outros.
Bem, assim é meu amigo Cláudia. Eu não o/a conhecia pessoalmente. Ou melhor: conhecia do palco, onde Cláudia enlouquece cantando, falando e mostrando-se de uma maneira tão atrevidamente escancarada que fica linda, lindo. Só conversamos face a face, pela primeira vez, há três semanas. Parece não ter nada que ver, mas tem tudo: eu adoro Marina Lima. Há três anos, no Rio, conheci Sergio Luz, que atualmente dirige Marina. Éramos amigos de (Ah! Os bordados da vida...) Ana Cristina César, e foi através dela que cruzamos caminhos. Mas isso é outra história. Ou nem tanto. Há três semanas, Sergio me convidou para jantar com ele, Marina, Antonio Cicero e outras pessoas. Lógico que fui. E lá estava também Cláudia, no meio de uma mesa enorme. Não havia lugar para todo mundo. Sentamos numa mesa próxima. Pouco depois, Cláudia veio sentar-se conosco, porque havia um senhor na outra mesa – um senhor poderoso – que não parava de agredir Cláudia. Começamos a conversar. Acabamos no Madame Satã, onde raramente ou nunca, felizmente, existem senhores como aquele, agredindo pessoas como Cláudia. Por não existirem interferências assim no mundo particular do Satã, foi que Cláudia e eu, naquela noite, nos tornamos amigos.
Para aquele senhor, e para a maioria de todos os outros senhores do mundo, a presença de Cláudia deve representar a suprema transgressão, a mais perigosa das ameaças. Tanto que andam matando pessoas como Cláudia, na noite negra e luminosa de Sampa. É que meu amigo Cláudia incorporou, no cotidiano, a mais desafiadora das ambigüidades: ela (ou ele?) movimenta-se o tempo todo naquela fronteira sutilíssima entre o “macho” e a “fêmea”. Isso em uma sociedade em que principalmente o genital é que determina o papel que você vai assumir. Porque se você é homem, você tem de fazer isso e isso e isso – não aquilo. E se você é mulher, deve fazer aquilo e aquilo e aquilo – não isso.
Movendo-se entre isso e aquilo, meu amigo Cláudia conquista o direito interno/subjetivo de fazer isso e também aquilo. Mas perde o direito externo/objetivo de fazer nem isso nem aquilo. Tomamos vodca juntos na madrugada falando de solidão, essa grande amiga em comum de todos nós. Trocamos telefones, nos encontramos outra vez. Gosto tanto de seus olhos muito abertos, atentos a tudo, contemplando diretamente o mais de dentro de cada um.
Agora virei seu fã. Hoje, às 23h, Cláudia apresenta-se no Teatro do Bexiga. Se você quiser, também pode conhecer meu amigo Cláudia. A propósito, ela (ou ele – que importa, afinal, um ‘e’ ou ‘o’ ou ‘a’ no artigo ou pronome que precede o nome de uma pessoa?) autobatizou-se com o sobrenome Wonder, que em inglês quer dizer “milagre”, ou “prodígio”, ou ainda “maravilha”, “surpresa”, “espanto”. Todas essas sensações são justamente as que meu amigo Cláudia Wonder passa, no palco e na vida. E por tudo isso, me sinto muito orgulhoso de ser seu amigo.
Claudia Wonder
Meu amigo Cláudia Wonder
A performer, cantora, compositora, atriz, escritora e ícone do underground Cláudia Wonder, subverte todos os estereótipos na vida e na arte, escancarando de forma linda e sensível sua verdade interior na consciência transformadora da arte trangressora. Wonder em inglês quer dizer “milagre”, ou “prodígio”, ou ainda “maravilha”, “surpresa”, “espanto”.
Artista, ser humano, ativista e dona de uma reputação que nem todos os adjetivos seriam capazes de descrever, Cláudia começou sua carreira como roqueira, no movimento punk paulista do início dos anos 80. Vocalista das bandas Jardim das Delícias e Truque Sujo, emplacou temporadas em casas que marcaram época, como o lendário Madame Satã, onde se apresentava com "Vômito do Mito". No show, Cláudia ficava nua, usando apenas uma máscara animalesca em uma banheira de groselha.
Paralelamente, a artista, que inspirou referências da cultura brasileira como José Celso Martinez Corrêa, Cazuza e Caio Fernando Abreu, desenvolveu um sólido trabalho como atriz.
No teatro, participou de peças como "Ave Noturna", de Ronaldo Ciambroni, com direção de Alberto Soares, "Lobsalda, a Vampira Vulgar", com direção de Eduardo Curado, "Nossa Senhora das Flores", de Jean Genet, com direção de Luiz Armando Queiroz e Maurício Abudi, e "Erótica - Tudo pelo sensual" no Teatro Brasileiro de Comédia. No cinema entre outros filmes fez “O Marginal”, de Carlos Manga, "Dores de amor", do suíço Matthias Kalin e “Carandiru” de Hector Babenco. Na TV estrelou o teleteatro"Má Consciência", na TV Cultura.
Depois de morar na Suíça por longos 11 anos, Cláudia voltou ao Brasil em 2001 e gravou uma música sua na coletânea “Melopéia” de Glauco Mattoso em dueto com seu amigo Edson Cordeiro e junto a artistas renomados como Arnaldo Antunes e Itamar Assunção.
Atualmente a diva é tema do documentário "Meu amigo Cláudia", dirigido por Dácio Pinheiro, o nome do documentário vem de um texto de Caio Fernando Abreu, publicado originalmente no jornal Estado de São Paulo de 1986, em que homenageia sua grande amiga. Com bom humor e depoimentos emocionados de gente de peso como Sérgio Mamberti e Zé Celso Martinez, o filme faz um trajeto desde a infância e o descobrimento da sexualidade, até virar musa de cineastas e atuar em vários filmes e peças de teatro.
Nas palavras de Caio Fernando Abreu : Cláudia é uma das pessoas mais dignas que conheço. E aqui preciso deter-me um pouco para explicar o que significa, para mim, “digno” ou “dignidade”. Nem é tão complicado: dignidade acontece quando se é inteiro. Mas o que quer dizer ser “inteiro”? Talvez, quando se faz exatamente o que se quer fazer, do jeito que se quer fazer, da melhor maneira possível.
Por Daiversom Machado - dsilveiramachado@yahoo.com.br
Você subverte todos os estereótipos como pessoa e como artista. Pra você o que é ser diferente?
Eu sempre quis ser uma pessoa original, nunca gostei da unanimidade, não que eu não goste de ser igual, eu me sinto igual a todo mundo, mas eu sempre gostei de fazer a diferença, isso é próprio do meu signo, eu sou aquariana, os aquarianos geralmente são pessoas originais. Inclusive eu lembro que eu era criança e assistia aqueles desfiles de fantasia de luxo e originalidade e eu sempre gostava mais de originalidade. Enfim, eu sei que sou muito criativa, mas falar pra você o que é ser diferente, não sei, eu acho que ser diferente é fazer a diferença, é ser você mesmo, é você não se dobrar aos ditames sociais e procurar ser o mais natural possível.
Me fale sobre toda aquela efervescência cultural da vanguarda paulista nos anos 80 na qual vc fez parte?
Foi muito bacana, porque foi justamente uma época muito efervescente na questão cultural, não só de São Paulo como do país e hoje em dia não se vê muito essa efervescência na noite, hoje é muito mais a coisa individualista que o culto é uma pessoa só, o DJ. Naquela época o bar Madame Satã, tinha um quintal, tinha a parte de cima, tinha o porão e ao mesmo tempo estava uma banda tocando no porão, uma cantora, um performer, um grupo se apresentando na parte de cima e no quintal um outro grupo fazendo mágica. Era efervescente não só pelos artistas, mas as pessoas estavam tomadas por um espírito criativo, a própria mudança política que estava acontecendo, talvez a conjuntura política estava fazendo isso com as pessoas, esse impulso de liberação, estavam botando pra fora de forma artística aquilo que estava reprimido a tanto tempo.
Como foi seu trabalho com o Teatro Oficina?
Eu trabalhei 4 anos com o Oficina e foi maravilhoso, foi minha escola de teatro, eu fiz aulas na Escola Macunaíma de Teatro, eu já tinha feito peças e tal e no Oficina fiz Nossa Senhora das Flores do Jean Genet que foi um marco no teatro de São Paulo dirigida pelo Luiz Armando Queiroz. Depois eu fui trabalhar com o Zé (o dramaturgo e diretor teatral José Celso Martinez Correa) que foi onde eu tive a minha escola de teatro, ali eu aprendi tudo enquanto artista e ser humano.
Você sempre esteve envolvida em militâncias, tendo inclusive contato com movimentos de direitos civis em outros paises. O que significa a luta por direitos iguais pra você?
É a luta por poder existir inteiramente, poder viver a sua vida de maneira integral, viver a liberdade e a palavra é essa, eu acho que um ser humano que não é livre não pode se realizar e nós estamos aqui para sermos felizes. Eu não me conformo e nunca me conformei com a desigualdade, porque se tem alguma lógica a gente entende, mais quando proíbem e não nos dão explicação para o que estão nos proibindo e você não encontra uma lógica por mais que você estude, por mais que você pense e reflita sobre o assunto, então isso significa que alguma coisa está errada. Você não vai me proibir uma coisa que você não me dá explicação lógica, e eu não encontro lógica no preconceito contra as diferenças sexuais.
Me fale sobre o documentário que fala sobre vc “Meu amigo Claudia”, premiado em festivais na Europa. O que é pra você ter sua vida e suas nuances retratados em um filme?
Tem sido maravilhoso, estreou em São Francisco e eu fui convidada pelo Queer Culture Center pra me apresentar no Trans March e fui recebida com todas as honrarias que uma pessoa importante poderia ser recebida, eu nunca tive tanto reconhecimento do meu trabalho em toda a minha vida, e isso em São Francisco que é o berço da militância gay. A meca do movimento GLBT mundial reconhecer isso pra mim não tem preço, foi realmente o evento mais importante da minha vida.
Como foi a experiência do livro “Olhares de Claudia Wonder”?
Foi muito bacana, foi a concretização do meu trabalho na G Magazine como colunista, pois no livro foram reunidos crônicas que foram publicadas na revista.
Fale sobre seus últimos trabalhos como cantora?
Eu lancei o CD Funk Disco Club que foi o primeiro disco solo, eu já tinha lançado duas coletâneas, o primeiro foi o Melopéia do Glauco Matoso, neste disco eu faço um soneto do Glauco Matoso em dueto com o Edson Cordeiro e depois teve uma musica minha no cd Body Rapture., que foi o primeiro disco de musica eletro nacional. Em 2009, ganhamos o premio revelação da nova musica brasileira, na Rádio Cultura no Programa do Solano Ribeiro. O Solano é a maior sumidade em matéria de musica no Brasil porque foi ele quem descobriu Elis Regina, Caetano Veloso, Gil, Chico Buarque, toda a nata da nossa musica foi ele quem lançou, ele que produziu todos aqueles festivais de musica da Record nos anos 60, um cara antenadíssimo, foi ele quem trouxe Michael Jackson para o Brasil naquela época dos Jacksons 5. Enfim, é o cara, e receber um premio das mãos dessa pessoa, realmente o que eu posso dizer é: pô valeu a pena. Na minha carreira na música estou muito feliz.
Assistam ao trailer do documentário "Meu amigo Cláudia":
Dionisíacas
Um pensamento que o Teatro Oficina sempre pregou, é o da libertação que a arte pode nos proporcionar em todos os sentidos. Neste final de semana ao participar das Dionísiacas, uma maratona de 18 horas de espetáculos, Bacantes, O Banquete e Cacilda! Estrela Brasileira à Vagar!, pude presenciar que a manifestação dessa ruptura de padrões está na estrutura e no cerne do pensamento do Oficina e de Zé Celso. Os público foi aos poucos se despindo de todos os conceitos e preconceitos e no final estavam todos nus, inclusive eu. Um transe coletivo indescrítivel que me mudou muito, observar a relação dos atores com a platéia no teatro de estádio e a sacralização do fazer teatral me fizeram rever conceitos que nem eu sabia que tinha.
Teatro Oficina é a arte viva, um terreiro eletrônico que mostra que a arte não pode parar. A gente tem que ver, que não existe só o papai e mamãe de todo dia, existe o respeito de dar pra todo mundo e de receber de todo mundo. Faz parte do conhecimento da vida. Arte sem cabaço, em um mundo em estado de guerra, a guerra entranhada em todos os lugares, precisamos de possibilidades de entendimento dos contrários, tendo tesão pelo adversário, devorar e ser devorados. Arte crítica, inovadora, insolente, sacana, libertadora. O que o Oficina fez comigo foi transformar o Tabu em Totem, em algo bom, o melhor de nós, lambido, chupado, beijado, phodido...
Existe vários tipos de colonialismo, entre eles o colonialismo do corpo, essa estrutura moralista da sociedade reflete no corpo, onde pessoas nunca são tocadas, é necessário libertar o corpo da influência do catecismo, desse monte de verdades que nos cercam. Em transe embevecido pela ritualística, ficar "pelado" significou pra mim a descolonização do corpo abstrato, muito além do corpo físico. A arte sacralizada, arte como ritual de entrega e despojamento total, dentro desta lógica, a arte é aquele luxo que a sociedade te dá, é uma arte do ócio, que vem do cio, mas vivemos em sociedade que considera isso pecado e que não sacraliza o ritual da arte como forma de experimentação, desprendimento e pra isso é preciso ócio no sentido de se entregar totalmente à vida, e ai cai na roleta da sociedade judaico-cristã e vira culpa.
Meus ânimos se exaltam porque tudo isso me mostra que existem coisas muito maiores que a mediocridade que nos cerca, principalmente em se tratando de arte. Há uns dois anos que acompanho o Zé Celso e apesar de não ser ator e nem trabalhar com teatro, me identifiquei demais. O grande mérito da cultura é expandir a noção que temos de poder pensar as coisas de outra maneira, a falta de consciência e a superficialidade, faz com que suba na cabeça das pessoas o arrivismo daquela velha idéia da classe média emergente. Essa experimentação, já tinha me tomado de assalto com os filmes marginais, principalmente Sem Essa Aranha de Sganzerla e o cinemanovista Terra em Transe de Glauber com toda aquela compreensão sangrada da realidade brasileira. A experiência com o Oficina é indescritível, aquele transe da hora é comovente e fica aquela eufórica sensação de estar mais pronto pra vida. Foi uma bela troca, onde todos fomos cúmplices e nos beijamos, apaixonados...
Que venha o Anhangabaú da FelizCidade, a Ágora Grega que vai trazer essa revolução para as ruas de São Paulo e do Brasil.
Pecados de Cassandra
Por Marcelo Rubens Paiva
Cena 1: Anos 70. Os amigos de escola Marcelo, Marcus e Eduardo, todos com seus 15 anos, viajam num ônibus pela Dutra.
Marcelo lê um livro, rasga a página lida e entrega para os amigos. Eventualmente, eles comentam a narrativa. Eventualmente, algum deles se levanta para ir ao banheiro. Vai fazer justiça com as próprias mãos.
Close: A capa era de "A Gata" ou "Carne em Delírio", livros que prestavam um grande serviço a milhares de leitores, passavam de mão em mão, alimentavam a imaginação e acabavam educando uma geração.
São obras da escritora Cassandra Rios, que morreu na semana passada em São Paulo.
Cena 2: Da janela do ônibus, vê-se um Brasil conservador. Nada de revistas eróticas nas bancas. Nada de programas de TV analisando a sexualidade e seus labirintos. Nada de educação sexual nas escolas. Nada de amor livre, sexo antes do casamento, concepção. E, sim, as mulheres não sentiam prazer na relação, dizia-se.
Cena 3: Corta para o cemitério Santo Amaro, em São Paulo, março de 2002. No enterro de Cassandra Rios, na verdade Odete Rios, nascida em 1932, um parente recita uma frase dita por ela, enquanto joga terra sobre o caixão: "Se o homem escreve, ele é sábio, experiente. Se a mulher escreve, é ninfomaníaca, tarada".
Cena 4: Nas estantes das maiores livrarias do país, procura-se em vão uma obra da autora, que vendia 300 mil exemplares por ano à sua época.
Também não há referências sobre ela em sites de livrarias. Encontra-se apenas um livro, que amarela num sebo, mas tem e teve lugar reservado na memória de muitos -como o cantor Cazuza e a escritora Fernanda Young.
Contexto
Como dita os manuais da literatura comparada, para entender Cassandra Rios é preciso entender sua época e ambiente.
Não havia imagens de sexo, a não ser em livros de medicina legal. No Brasil pré-contracultura, taras individuais não eram debatidas. O estranho era considerado desvio a ser combatido pelo Estado, com a censura.
A exibição de seios só era permitida em documentários sobre índios. "Amaral Neto, o Repórter" serviu para muitos adolescentes descobrirem o que havia escondido numa mulher.
Cassandra falava às claras sobre o prazer feminino. Talvez por isso tenha sido uma das personalidades mais censuradas.
Tratava-se de uma mulher escrevendo sobre tesão de mulher, numa sociedade cuja predominância religiosa afirmava que a mulher apenas se deitava com um homem para gerar filhos de Deus.
Seus livros surpreendiam. Cassandra rivalizava com uma outra autora erótica e sua contemporânea, Adelaide Carraro, assim como Hemingway rivalizou com Scott Fitzgerald.
Enquanto Cassandra tinha um estilo mais ousado, extrovertido, Adelaide era linear, contida. Em Cassandra, há empresários corruptos, que fazem despachos em terreiros de umbanda.
Cassandra já no título era direta, como, por exemplo, "A Volúpia do Pecado", de 1948, seu livro de estréia, que a transformou numa das autoras mais vendidas da história da literatura brasileira.
Ela o escreveu com 16 anos. Fazia uma literatura assumidamente popular. Eram livros baratos. Havia desenhos provocantes nas capas: moças oferecidas em poses sutilmente sensuais.
Nas poucas entrevistas que deu, ela dizia que, no fundo, era uma simples dona-de-casa conservadora, que suas narrativas fluíam sem controle e que ela mesma ficava enrubescida com aquelas cenas mais quentes.
Chegou a escrever um livro "sério", "MezzAmaro", uma autobiografia que não fala de sexo, com 400 páginas. Chegou a ter o livro "A Paranóica" adaptado para o cinema, sobre uma filha que descobre que seu pai é falso e quer apenas roubar a grana da família. Na tela, o livro virou "Ariella", revelando a atriz Nicole Puzzi.
Em muitas faculdades brasileiras, pesquisadores deveriam estar estudando Cassandra Rios. Foi uma precursora. Sua importância não será esquecida. Nem a libido de suas personagens.
Download do livro Carne em Delírio
Andy Warhol
"Devagar com a louça: conheci o verdadeiro
Rei do Pop (pop-art) há alguns anos, e seu nome era Marcel Duchamp.
Para mim, Andy era a Rainha do Pop..."
Ultra Violet in "Famous For 15 Minutes"
Esqueça as imagens ultra-coloridas de Marilyn Monroe ou mesmo as gigantescas latas das sopas Campbell’s. É pouco comentado, mas o excêntrico artista plástico norte-americano, Andy Warhol (1928-1987), fez dezenas de filmes experimentais, entre curtas e longas-metragens, registros de shows e de performances artísticas. Com raros DVDs disponíveis no Brasil, apenas 6 títulos lançados pela Magnus Opus, a obra cinematográfica de Warhol merece atenção. Primeiro pela ousadia estilística, que se aproxima radicalmente, em sua medula estética, das artes plásticas (como nos screen tests). Depois pela perversão de sua câmera intimista que erotiza o cotidiano e os personagens ‘reais’ - como na tríade - Flesh (1968), Trash (1970) e Heat (1972) – produzida em parceria com Paul Morrissey.
O cinema de Warhol faz jus ao espírito underground que rondava seu ateliê, o estúdio Factory. Lá ele promovia as mais ousadas festas e experimentos estéticos. Transitavam artistas, estilos, artes e sexualidades. Era comum, numa tarde qualquer, encontrar por lá os velvets Lou Reed e Nico, ou mesmo personalidades como Baby Jane Holzer, Edie Sedgwick, Joe Dalessandro, Dennis Hopper, Mick Jagger, e ainda loverboys, prostitutas e transeuntes curiosos.
Inserido na contracultura dos anos 60, o espaço logo se tornou uma fábrica de arte underground que produzia desde fotografias em série até filminhos curtos, os intitulados screen tests. Eles captavam inúmeras faces de personalidades, como se fossem retratos-vivos. Filmados em P&B, os takes revelam plasticidade pela aparente imobilidade dos retratados. Pois, apesar do rosto-vivo-morto, podemos perceber traços emotivos dos fotografados: inibição, sorrisos tímidos (como o de Susan Sontag) e irreverência, como algumas mulheres se descabelando ou mesmo Salvador Dalí de ponta-cabeça. Os screen tests, além de embaralharem artes plásticas, cinema, performance e vídeo-arte, são interessantes experiências estéticas sensoriais.
De sua fase cinematográfica, também podemos ver um longo plano-seqüência do Empire State Building, visto como uma grande personalidade ‘arquitetônica’, fálica, filmada em sua ereção constante, do amanhecer ao pôr-do-sol. Há ainda short films, produzidos entre 1963 e 1965, que erotizam ações comuns: Blow Job (foto) flagra em poucos minutos apenas o rosto de um rapaz que tem prazer sexual; Sleep observa à distância um jovem dormindo em sua rara movimentação sonífera; Kiss (foto acima) mostra um quadro-vivo com cenas de casais se beijando; entre outros da série, como Mario Banana e Eat.
Warhol aprimorou o fetiche estético do ‘corpo em performance’ em longas-metragens produzidos após 1965: My Hustler (1965), The Velvet Underground and Nico (1966), Chelsea Girls (1966), Bike Boy (1967) e Lonesome Cowboys (1969). Com tramas banais e linguagem naturalista, o cineasta capturou, como num flash de Polaroid, o zeitgeist de sua época, em filmes voyeuristas, undergrounds, improvisados, erotizados, e com certa liberdade estética de dar inveja em qualquer estreante do Dogma 95.
Bom-crioulo, de Adolfo Caminha: estratégias para uma narrativa homoerótica por Alfredo Fressia
"Sua amizade ao grumete nascera, de resto, como
nascem todas as grandes afeições, inesperadamente, sem
precedentes de espécie alguma, no momento fatal em
que seus olhos se fitaram pela primeira vez. Esse movimento
indefinível que acomete ao mesmo tempo duas
naturezas de sexo contrários, determinando o desejo
fisiológico da posse mútua, essa atração animal que faz
o homem escravo da mulher e que em todas a espécies
impulsiona o macho para a fêmea, sentiu-a Bom-Crioulo
irresistivelmente ao cruzar a vista pela primeira
vez com o grumetezinho. Nunca experimentara semelhante
cousa, nunca homem algum ou mulher produzira-
lhe tão esquisita impressão, desde que se conhecia!
Entretanto, o certo é que o pequeno, uma criança de
quinze anos, abalara toda a sua alma, dominando-a,
escravizando-a logo, naquele mesmo instante, como a
força magnética de um imã."
Diante de um romance como Bom-Crioulo (1895), de Adolfo Caminha (Aracati, Ceará, 29 de maio de
1867-Rio de Janeiro, 1o. de janeiro de 1897), resulta quase inevitável a reflexão sobre o aleatório destino crítico de toda obra literária. Primeiro romance de tema totalmente homoerótico da literatura brasileira e inscrito na história literária sob o rótulo "naturalista", o texto tinha, por seu tema, antecedentes nacionais na mesma escola naturalista: os episódios de homossexualidade masculina em O Ateneu (1888), de Raúl Pompéia, e feminina, em O Cortiço (1890), de Aluísio Azevedo. No entanto, em Bom-Crioulo o homoerotismo masculino é a "única" paixão exposta, o motivo sobre o qual se estrutura todo o relato, e desde o qual se criam, de fato, todas as personagens. Como, além do mais, os protagonistas desse amor vestem os uniformes da Marinha nacional, a crítica de seu tempo, e do presente século até a década de 70, reagiu com perplexidade, e não tanto pelo recurso à mera detração, improvável diante de um texto que reúne demasiadas qualidades, mas sim pelo puro e simples silenciar-se.
É sabido que a patologização dos comportamentos homoeróticos alcançou sua maior intensidade no "século obscuro", o período que poderia ser inscrito entre as datas de 1869 (invenção da palavra "homossexualidade" e momento privilegiado do discurso repressivo) e 1968 ("liberação" dos costumes). Não resulta então casual que, desmontada uma boa parte dos dispositivos ideológicos desse "século", a crítica haja "redescoberto" este romance que, se nunca foi uma peça arqueológica da literatura latino-americana, agora se revela como um esplêndido documento de estratégias estéticas destinadas à abordagem de um tema em seu momento "tabu", e sem dúvida "perigoso". Como para compensar o silêncio crítico que cercou a obra, os últimos anos viram multiplicar-se os estudos específicos, as reedições e as traduções. (Em espanhol, existe pelo menos desde 1987 a edição de Ed. Posada, México, que manteve o mesmo título do original. Em inglês existe como Bom-Crioulo: The Black Man and the Cabin Boy, trad. de E. A. Lacey, San Francisco, Gay Sunshine Press. Com introdução de R. Howes.)
Chamando "Adolfo Caminha", o leitor encontra na Internet centenas de "sites", que incluem livrarias onde comprá-lo, teses universitárias, repertórios de literatura gay. Como, além do mais, Caminha tem sido autor freqüentemente obrigatório nos programas escolares dos últimos anos, suas edições não somente são facilmente encontradas como também vêm quase sempre anotadas e precedidas de pedagógicos prefácios (o que pode facilitar a leitura "internacional", alheia ao menos em parte ao locus exclusivamente brasileiro da obra e suas possíveis maneiras de acesso).
Por ocasião do centenário da morte do autor, multiplicaram-se também os perfis biográficos de Caminha e, sem dúvida, a tentação de descobrir o que possa haver de autobiográfico em sua obra. Adolfo Caminha foi efetivamente oficial da Marinha imperial, formado na escola naval do Rio de Janeiro, onde vivia desde 1883. Além do mais, em sua breve existência, Caminha protagonizou dois "escândalos" reveladores de seu carisma e também de sua incapacidade de conformar-se diante de qualquer status quo. Em 1884, como cadete naval, ousou discursar em certa cerimônia diante do Imperador Pedro II, expondo suas idéias republicanas e anti-escravagistas. O Imperador e a conservadora Marinha, de maioria monárquica, foram então indulgentes com ele. Não o seriam no outro episódio "escandaloso" de sua vida. Em 1888, já oficial, Camiha havia retornado a Fortaleza, a capital de seu estado natal, e ali se uniu à esposa de um oficial do exército, que lhe daria duas filhas. A proporção que adquiriu este episódio na provinciana Fortaleza da época está à altura da indignação que o futuro narrador manifestará diante da hipocrisia social. Sobrevivendo como funcionário público, Caminha retorna ao Rio em 1892, onde se dedicará ao jornalismo, à crítica literária (notas das quais resultará o livro Cartas literárias, de 1895) e à redação daqueles que seriam seus três romances (A Normalista, 1893; Bom-Crioulo, 1895; e Tentação, 1896), enquanto lutava contra a tuberculose que segaria sua vida aos 29 anos.
A audácia de publicar um livro homoerótico em 1895 custou a Caminha algo mais que o silêncio crítico sobre a obra. A audácia supôs também um trabalho de verdadeiro artífice do estilo, o que acabou garantindo a modernidade do texto. O narrador não tenta, em momento algum, tornar o tema opaco (um recurso freqüente na literatura propriamente gay, a do "século obscuro"). Nada mais explícito que o desejo desses homens, cujos atos de amor são narrados com sensualidade e com detalhes bem mais próprios da atual literatura postgay (sobre o deslinde postgay, ver meu artigo Acerca da literatura gay, publicado nesta revista eletrônica), a pouco econômica narrativa homoerótica dos últimos trinta anos. Caminha não se impõe os "limites" temáticos que a bienséance de 1895 podia exigir. O trâmite que negocia a própria existência desta narrativa na época radica no uso, meramente convencional, da retórica naturalista, de larga influência no Brasil, e na qual Caminha declara inscrever-se. Porém é paradoxal que, de fato, nenhum de seus três relatos logre o naturalismo que o autor predica. (Em A Normalista Caminha toca a mesma inverossimilhança). No caso de Bom-Crioulo, trata-se melhor de um recurso de sobrevivência. A saber, o autor, ao mesmo tempo em que afeta uma retórica naturalista, desautoriza, ao longo do relato, cada um dos princípios da escola de Médan. Emile Zola e seu grupo propunham privilegiar as "condições fisiológicas", a influência do meio social ("os meios", dizia Zola) como determinantes do ser humano. A psicologia ficava subordinada à "fisiologia", que inclui a hereditariedade e alguns componentes do que se denominará o darwinismo racial.
Com efeito, quando no primeiro dos 12 capítulos do relato, se apresenta o marinheiro Amaro (apodado Bom-Crioulo, um equívoco apelido), com seu corpo "colossal" e um "formidável sistema de músculos", o narrador menciona "a morbidez patológica de toda uma geração decadente e enervada". A essa altura o leitor imagina de boa fé que enfrentará um estudo "científico-naturalista". No entanto, a obra já não voltará ao tema da "decadência" racial e a menção terá sido uma mera concessão retórica ao "naturalismo" em voga para poder, em troca, apresentar um universo sado-masoquista. O romance se abre, de fato, com a tortura infligida diante de todos os tripulantes por um oficial e seu assistente a Bom-Crioulo e outros dos marinheiros (por delitos que incluem a masturbação). O personagem de Amaro é criado sobre a beleza e a dor (mas também sobre a obscura beleza da dor): "Bom-Crioulo tinha despido a camisa de algodão, e, nu da cintura pra cima, numa riquíssima exibição de músculos, os seios muito salientes, as espáduas negras reluzentes, um sulco profundo e liso de alto a baixo no dorso, nem sequer gemia, como se estivesse a receber o mais leve dos castigos".
Por outro lado, a "fisiologia" e as condições sociais dos três personagens que fazem evoluir a ação, são
demasiado diversas: Bom-Crioulo é um escravo "fugido", refugiado na Marinha; Aleixo, o outro marinheiro, é um jovem e loiro adolescente do sul do Brasil, filho de pescadores catarinenses que se alista na Marinha, e no navio conhecerá a inesperada paixão que Bom-Crioulo lhe devota. Em terra, a portuguesa Carolina, é quase uma meretriz, gorda, hedonista e covarde. Não devia escapar a Caminha que os meios sociais e raciais concernidos eram demasiado heterogêneos para cumprir com as receitas do habitual romance à thèse naturalista.
Caminha construiu em Bom-Crioulo um romance de forte conteúdo erótico (não "pornográfico", segundo o equívoco deslinde que se costuma fazer, e ainda se no Brasil, que chegava ao século XX, já existisse literatura homoerótica "pornográfica") [1], e é evidente que tampouco lhe escapava a "gravidade" do tema, que o autor aborda com detalhes mais de connaisseur que de "cientista". O que fica de sua narração (e o que a torna "moderna") é a sensualidade da matéria narrada, e não os restos dessa estratégia "científica" que inclui, de vez em quando, e quando Caminha não se distrai, nomes como "uranismo", "anomalia", "desejo de macho torturado pela carnalidade grega". Um bom exemplo do trâmite narrativo de Caminha se encontra na sensual descrição da primeira relação de Bom-Crioulo e Aleixo, ainda no barco, quando "uma sensação de ventura infinita espalhava-se-lhe em todo o corpo"]. No momento da penetração, o relato é violentamente interrompido por este comentário estratégico que encerra o capítulo: "E consumou-se o delito contra a natureza".
Em Bom-Crioulo a própria sucessão dos segmentos narrativos é mais própria do romance erótico que do "naturalismo". Caminha, um homem de forte militância política, concentra o relato, no entanto, na paixão, como corresponde à estética do erotismo, e o "meio" torna-se demasiado descuidado para um romance que retoricamente se adscreve à escola naturalista. A paixão, na estética literária, é sempre "universal", e, com efeito, no fechado universo de Bom-Crioulo o leitor teria que estar muito atento para ler os signos políticos do "meio", a ponto de vacilar se deve situá-lo no final do Império (de fato ali se situa) ou já na República, depois de 1889. Esta vocação "universal" do relato, própria da estética erótica, também se manifesta na "universalidade" do homoerotismo apresentado: quase todos os personagens, de marinheiros a oficiais, praticam o homoerotismo, ou o praticaram, ou discursam sobre ele com uma benevolência inesperada [2].
Finalmente, a ação se concentra em apenas três personagens, em total desmedro do conjunto social, incluída aí a micro-sociedade do navio e dos embarcadouros do Rio. Mais ainda, com a relativa exceção de Bom-Crioulo (o único que trata de entender sua falta de interesse pelo sexo feminino, os anos em que, desorientado, se manteve virgem), os personagens são rápidos e de desembaraçada "psicologia", como se somente a paixão aclarasse tudo. Aleixo, como personagem, evolui apenas da ingenuidade ao oportunismo. Instalados na capital, na pensão da Carolina, Aleixo terá uma relação paródica, quase burlesca com ela. Bom-Crioulo, outra vez castigado pelos oficiais por participar de uma altercação ne rua, acaba no hospital da Marinha, criando um rápido vazio na vida de Aleixo, espaço que será preenchido por Carolina, um personagem criado com ironia: "Carola Bunda" (sic), uma "mulher-homem", excessiva em tamanho e cuja avidez sensual o jovem Aleixo satisfaz mal e por mero oportunismo.
Apesar do trâmite falsamente "naturalista" que o leitor desmonta hoje com facilidade, e apesar também da sensualidade e simpatia com que é criado o protagonista, Caminha tampouco se apresenta como especialmente "abandeirado" do homoerotismo (uma atitude sem dúvida militante, e mais própria da literatura postgay). Por mais que o erotismo do único personagem feminino toque o grotesco, a homossexualidade masculina de Bom-Crioulo não é per se de signo positivo. Sua prática não "melhora" (ainda que tampouco "piore") as personagens. Assim, quem comanda a última tortura física do protagonista, que o conduzirá ao hospital, será um oficial conhecido por sua afeição pelo amor "grego".
Além do mais, o romance tem um fim trágico: traído, e movido pela vingança, Bom-Crioulo mata Aleixo. É interessante que o desenlace arquitetado pelo autor não tenda ao murcho moralismo, à parábola moralizante da ideologia de sua época. O crime, mais do que pela evolução das "psicologias", se justifica por uma rede muito mais fina que o narrador cria durante todo o relato: as relações de poder que, essas sim, parecem preocupar ao político Caminha, e que em Bom-Crioulo, por sua estética erótica, desembocam em um universo sado-masoquista ao qual o narrador outorga toda sua parafernália estética (castigos, chicotes, instrumentos fálicos, isolamento, ambientes sombrios, fardas, suspensão do peso da "realidade", em particular social, mas também do tempo, passado ou futuro): "E não era somente questão de possuir o grumete, de gozá-lo como outrora (…) era questão de gozá-lo, maltratando-o, vendo-o sofrer, ouvindo-o gemer… Não, não era somente o gozo comum, a sensação ordinária (…) era o prazer brutal, doloroso, fora de todas as leis, de todas as normas…". Se Caminha foi um indignado com a sociedade de seu tempo (incluindo a mediocridade provinciana de Fortaleza, a frivolidade da capital e, mais ainda, a rebeldia diante das convenções sociais), Bom-Crioulo foi a obra estética privilegiada para a expressão de sua desconformidade. É o que torna este romance erótico um permanente jogo sincrônico de códigos, um objeto sempre a ponto de desorientar o leitor, capaz de desconcertar também a crítica, e seguir instigando-a um (longo) século depois da sua criação.
NOTAS
1 Ver Além do carnaval, a homossexualidade masculina no Brasil do século XX, de James N. Green. São Paulo, UNESP, 2000.
2 Às críticas negativas, Caminha respondeu no artigo Um livro condenado na revista literária A Nova Revista, vol. 2, Rio de Janeiro, fevereiro de 1886. Fala de "um verdadeiro escândalo ou ato inquisitorial da crítica, talvez o maior escândalo do ano passado". Utiliza ali a palavra homossexualismo, quando ataca a hipocrisia dos que elogiavam Flaubert, Zola, Maupassant, Eça de Queiroz, mas condenavam Bom-Crioulo. É outro bom exemplo de sua estratégia: "Qual é mais pernicioso: o Bom-Crioulo em que se estuda e condena o homossexualismo, ou essas páginas que andam pregando por aí, em tom filosófico, a dissolução da família, o concubinato, o amor livre e toda espécie de imoralidade social?" Recorde-se, de passo, que Caminha se mostra, neste artigo, atualizado em suas leituras (médicas, no caso) sobre o tema homossexual. Menciona o Dr. Ambroise Tardieu (Étude médico-légale sur les attentats aux moeurs, 1857), Dr. Albert Moll (Les perversions de l'instinct génital, 1893) e Richard von Krafft-Ebing.
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nascem todas as grandes afeições, inesperadamente, sem
precedentes de espécie alguma, no momento fatal em
que seus olhos se fitaram pela primeira vez. Esse movimento
indefinível que acomete ao mesmo tempo duas
naturezas de sexo contrários, determinando o desejo
fisiológico da posse mútua, essa atração animal que faz
o homem escravo da mulher e que em todas a espécies
impulsiona o macho para a fêmea, sentiu-a Bom-Crioulo
irresistivelmente ao cruzar a vista pela primeira
vez com o grumetezinho. Nunca experimentara semelhante
cousa, nunca homem algum ou mulher produzira-
lhe tão esquisita impressão, desde que se conhecia!
Entretanto, o certo é que o pequeno, uma criança de
quinze anos, abalara toda a sua alma, dominando-a,
escravizando-a logo, naquele mesmo instante, como a
força magnética de um imã."
Diante de um romance como Bom-Crioulo (1895), de Adolfo Caminha (Aracati, Ceará, 29 de maio de
1867-Rio de Janeiro, 1o. de janeiro de 1897), resulta quase inevitável a reflexão sobre o aleatório destino crítico de toda obra literária. Primeiro romance de tema totalmente homoerótico da literatura brasileira e inscrito na história literária sob o rótulo "naturalista", o texto tinha, por seu tema, antecedentes nacionais na mesma escola naturalista: os episódios de homossexualidade masculina em O Ateneu (1888), de Raúl Pompéia, e feminina, em O Cortiço (1890), de Aluísio Azevedo. No entanto, em Bom-Crioulo o homoerotismo masculino é a "única" paixão exposta, o motivo sobre o qual se estrutura todo o relato, e desde o qual se criam, de fato, todas as personagens. Como, além do mais, os protagonistas desse amor vestem os uniformes da Marinha nacional, a crítica de seu tempo, e do presente século até a década de 70, reagiu com perplexidade, e não tanto pelo recurso à mera detração, improvável diante de um texto que reúne demasiadas qualidades, mas sim pelo puro e simples silenciar-se.
É sabido que a patologização dos comportamentos homoeróticos alcançou sua maior intensidade no "século obscuro", o período que poderia ser inscrito entre as datas de 1869 (invenção da palavra "homossexualidade" e momento privilegiado do discurso repressivo) e 1968 ("liberação" dos costumes). Não resulta então casual que, desmontada uma boa parte dos dispositivos ideológicos desse "século", a crítica haja "redescoberto" este romance que, se nunca foi uma peça arqueológica da literatura latino-americana, agora se revela como um esplêndido documento de estratégias estéticas destinadas à abordagem de um tema em seu momento "tabu", e sem dúvida "perigoso". Como para compensar o silêncio crítico que cercou a obra, os últimos anos viram multiplicar-se os estudos específicos, as reedições e as traduções. (Em espanhol, existe pelo menos desde 1987 a edição de Ed. Posada, México, que manteve o mesmo título do original. Em inglês existe como Bom-Crioulo: The Black Man and the Cabin Boy, trad. de E. A. Lacey, San Francisco, Gay Sunshine Press. Com introdução de R. Howes.)
Chamando "Adolfo Caminha", o leitor encontra na Internet centenas de "sites", que incluem livrarias onde comprá-lo, teses universitárias, repertórios de literatura gay. Como, além do mais, Caminha tem sido autor freqüentemente obrigatório nos programas escolares dos últimos anos, suas edições não somente são facilmente encontradas como também vêm quase sempre anotadas e precedidas de pedagógicos prefácios (o que pode facilitar a leitura "internacional", alheia ao menos em parte ao locus exclusivamente brasileiro da obra e suas possíveis maneiras de acesso).
Por ocasião do centenário da morte do autor, multiplicaram-se também os perfis biográficos de Caminha e, sem dúvida, a tentação de descobrir o que possa haver de autobiográfico em sua obra. Adolfo Caminha foi efetivamente oficial da Marinha imperial, formado na escola naval do Rio de Janeiro, onde vivia desde 1883. Além do mais, em sua breve existência, Caminha protagonizou dois "escândalos" reveladores de seu carisma e também de sua incapacidade de conformar-se diante de qualquer status quo. Em 1884, como cadete naval, ousou discursar em certa cerimônia diante do Imperador Pedro II, expondo suas idéias republicanas e anti-escravagistas. O Imperador e a conservadora Marinha, de maioria monárquica, foram então indulgentes com ele. Não o seriam no outro episódio "escandaloso" de sua vida. Em 1888, já oficial, Camiha havia retornado a Fortaleza, a capital de seu estado natal, e ali se uniu à esposa de um oficial do exército, que lhe daria duas filhas. A proporção que adquiriu este episódio na provinciana Fortaleza da época está à altura da indignação que o futuro narrador manifestará diante da hipocrisia social. Sobrevivendo como funcionário público, Caminha retorna ao Rio em 1892, onde se dedicará ao jornalismo, à crítica literária (notas das quais resultará o livro Cartas literárias, de 1895) e à redação daqueles que seriam seus três romances (A Normalista, 1893; Bom-Crioulo, 1895; e Tentação, 1896), enquanto lutava contra a tuberculose que segaria sua vida aos 29 anos.
A audácia de publicar um livro homoerótico em 1895 custou a Caminha algo mais que o silêncio crítico sobre a obra. A audácia supôs também um trabalho de verdadeiro artífice do estilo, o que acabou garantindo a modernidade do texto. O narrador não tenta, em momento algum, tornar o tema opaco (um recurso freqüente na literatura propriamente gay, a do "século obscuro"). Nada mais explícito que o desejo desses homens, cujos atos de amor são narrados com sensualidade e com detalhes bem mais próprios da atual literatura postgay (sobre o deslinde postgay, ver meu artigo Acerca da literatura gay, publicado nesta revista eletrônica), a pouco econômica narrativa homoerótica dos últimos trinta anos. Caminha não se impõe os "limites" temáticos que a bienséance de 1895 podia exigir. O trâmite que negocia a própria existência desta narrativa na época radica no uso, meramente convencional, da retórica naturalista, de larga influência no Brasil, e na qual Caminha declara inscrever-se. Porém é paradoxal que, de fato, nenhum de seus três relatos logre o naturalismo que o autor predica. (Em A Normalista Caminha toca a mesma inverossimilhança). No caso de Bom-Crioulo, trata-se melhor de um recurso de sobrevivência. A saber, o autor, ao mesmo tempo em que afeta uma retórica naturalista, desautoriza, ao longo do relato, cada um dos princípios da escola de Médan. Emile Zola e seu grupo propunham privilegiar as "condições fisiológicas", a influência do meio social ("os meios", dizia Zola) como determinantes do ser humano. A psicologia ficava subordinada à "fisiologia", que inclui a hereditariedade e alguns componentes do que se denominará o darwinismo racial.
Com efeito, quando no primeiro dos 12 capítulos do relato, se apresenta o marinheiro Amaro (apodado Bom-Crioulo, um equívoco apelido), com seu corpo "colossal" e um "formidável sistema de músculos", o narrador menciona "a morbidez patológica de toda uma geração decadente e enervada". A essa altura o leitor imagina de boa fé que enfrentará um estudo "científico-naturalista". No entanto, a obra já não voltará ao tema da "decadência" racial e a menção terá sido uma mera concessão retórica ao "naturalismo" em voga para poder, em troca, apresentar um universo sado-masoquista. O romance se abre, de fato, com a tortura infligida diante de todos os tripulantes por um oficial e seu assistente a Bom-Crioulo e outros dos marinheiros (por delitos que incluem a masturbação). O personagem de Amaro é criado sobre a beleza e a dor (mas também sobre a obscura beleza da dor): "Bom-Crioulo tinha despido a camisa de algodão, e, nu da cintura pra cima, numa riquíssima exibição de músculos, os seios muito salientes, as espáduas negras reluzentes, um sulco profundo e liso de alto a baixo no dorso, nem sequer gemia, como se estivesse a receber o mais leve dos castigos".
Por outro lado, a "fisiologia" e as condições sociais dos três personagens que fazem evoluir a ação, são
demasiado diversas: Bom-Crioulo é um escravo "fugido", refugiado na Marinha; Aleixo, o outro marinheiro, é um jovem e loiro adolescente do sul do Brasil, filho de pescadores catarinenses que se alista na Marinha, e no navio conhecerá a inesperada paixão que Bom-Crioulo lhe devota. Em terra, a portuguesa Carolina, é quase uma meretriz, gorda, hedonista e covarde. Não devia escapar a Caminha que os meios sociais e raciais concernidos eram demasiado heterogêneos para cumprir com as receitas do habitual romance à thèse naturalista.
Caminha construiu em Bom-Crioulo um romance de forte conteúdo erótico (não "pornográfico", segundo o equívoco deslinde que se costuma fazer, e ainda se no Brasil, que chegava ao século XX, já existisse literatura homoerótica "pornográfica") [1], e é evidente que tampouco lhe escapava a "gravidade" do tema, que o autor aborda com detalhes mais de connaisseur que de "cientista". O que fica de sua narração (e o que a torna "moderna") é a sensualidade da matéria narrada, e não os restos dessa estratégia "científica" que inclui, de vez em quando, e quando Caminha não se distrai, nomes como "uranismo", "anomalia", "desejo de macho torturado pela carnalidade grega". Um bom exemplo do trâmite narrativo de Caminha se encontra na sensual descrição da primeira relação de Bom-Crioulo e Aleixo, ainda no barco, quando "uma sensação de ventura infinita espalhava-se-lhe em todo o corpo"]. No momento da penetração, o relato é violentamente interrompido por este comentário estratégico que encerra o capítulo: "E consumou-se o delito contra a natureza".
Em Bom-Crioulo a própria sucessão dos segmentos narrativos é mais própria do romance erótico que do "naturalismo". Caminha, um homem de forte militância política, concentra o relato, no entanto, na paixão, como corresponde à estética do erotismo, e o "meio" torna-se demasiado descuidado para um romance que retoricamente se adscreve à escola naturalista. A paixão, na estética literária, é sempre "universal", e, com efeito, no fechado universo de Bom-Crioulo o leitor teria que estar muito atento para ler os signos políticos do "meio", a ponto de vacilar se deve situá-lo no final do Império (de fato ali se situa) ou já na República, depois de 1889. Esta vocação "universal" do relato, própria da estética erótica, também se manifesta na "universalidade" do homoerotismo apresentado: quase todos os personagens, de marinheiros a oficiais, praticam o homoerotismo, ou o praticaram, ou discursam sobre ele com uma benevolência inesperada [2].
Finalmente, a ação se concentra em apenas três personagens, em total desmedro do conjunto social, incluída aí a micro-sociedade do navio e dos embarcadouros do Rio. Mais ainda, com a relativa exceção de Bom-Crioulo (o único que trata de entender sua falta de interesse pelo sexo feminino, os anos em que, desorientado, se manteve virgem), os personagens são rápidos e de desembaraçada "psicologia", como se somente a paixão aclarasse tudo. Aleixo, como personagem, evolui apenas da ingenuidade ao oportunismo. Instalados na capital, na pensão da Carolina, Aleixo terá uma relação paródica, quase burlesca com ela. Bom-Crioulo, outra vez castigado pelos oficiais por participar de uma altercação ne rua, acaba no hospital da Marinha, criando um rápido vazio na vida de Aleixo, espaço que será preenchido por Carolina, um personagem criado com ironia: "Carola Bunda" (sic), uma "mulher-homem", excessiva em tamanho e cuja avidez sensual o jovem Aleixo satisfaz mal e por mero oportunismo.
Apesar do trâmite falsamente "naturalista" que o leitor desmonta hoje com facilidade, e apesar também da sensualidade e simpatia com que é criado o protagonista, Caminha tampouco se apresenta como especialmente "abandeirado" do homoerotismo (uma atitude sem dúvida militante, e mais própria da literatura postgay). Por mais que o erotismo do único personagem feminino toque o grotesco, a homossexualidade masculina de Bom-Crioulo não é per se de signo positivo. Sua prática não "melhora" (ainda que tampouco "piore") as personagens. Assim, quem comanda a última tortura física do protagonista, que o conduzirá ao hospital, será um oficial conhecido por sua afeição pelo amor "grego".
Além do mais, o romance tem um fim trágico: traído, e movido pela vingança, Bom-Crioulo mata Aleixo. É interessante que o desenlace arquitetado pelo autor não tenda ao murcho moralismo, à parábola moralizante da ideologia de sua época. O crime, mais do que pela evolução das "psicologias", se justifica por uma rede muito mais fina que o narrador cria durante todo o relato: as relações de poder que, essas sim, parecem preocupar ao político Caminha, e que em Bom-Crioulo, por sua estética erótica, desembocam em um universo sado-masoquista ao qual o narrador outorga toda sua parafernália estética (castigos, chicotes, instrumentos fálicos, isolamento, ambientes sombrios, fardas, suspensão do peso da "realidade", em particular social, mas também do tempo, passado ou futuro): "E não era somente questão de possuir o grumete, de gozá-lo como outrora (…) era questão de gozá-lo, maltratando-o, vendo-o sofrer, ouvindo-o gemer… Não, não era somente o gozo comum, a sensação ordinária (…) era o prazer brutal, doloroso, fora de todas as leis, de todas as normas…". Se Caminha foi um indignado com a sociedade de seu tempo (incluindo a mediocridade provinciana de Fortaleza, a frivolidade da capital e, mais ainda, a rebeldia diante das convenções sociais), Bom-Crioulo foi a obra estética privilegiada para a expressão de sua desconformidade. É o que torna este romance erótico um permanente jogo sincrônico de códigos, um objeto sempre a ponto de desorientar o leitor, capaz de desconcertar também a crítica, e seguir instigando-a um (longo) século depois da sua criação.
NOTAS
1 Ver Além do carnaval, a homossexualidade masculina no Brasil do século XX, de James N. Green. São Paulo, UNESP, 2000.
2 Às críticas negativas, Caminha respondeu no artigo Um livro condenado na revista literária A Nova Revista, vol. 2, Rio de Janeiro, fevereiro de 1886. Fala de "um verdadeiro escândalo ou ato inquisitorial da crítica, talvez o maior escândalo do ano passado". Utiliza ali a palavra homossexualismo, quando ataca a hipocrisia dos que elogiavam Flaubert, Zola, Maupassant, Eça de Queiroz, mas condenavam Bom-Crioulo. É outro bom exemplo de sua estratégia: "Qual é mais pernicioso: o Bom-Crioulo em que se estuda e condena o homossexualismo, ou essas páginas que andam pregando por aí, em tom filosófico, a dissolução da família, o concubinato, o amor livre e toda espécie de imoralidade social?" Recorde-se, de passo, que Caminha se mostra, neste artigo, atualizado em suas leituras (médicas, no caso) sobre o tema homossexual. Menciona o Dr. Ambroise Tardieu (Étude médico-légale sur les attentats aux moeurs, 1857), Dr. Albert Moll (Les perversions de l'instinct génital, 1893) e Richard von Krafft-Ebing.
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Poema da Eternidade sem Vísceras
Na última lua eu odiava as montanhas
minha memória quebrada não pode receber
o amor
eu tomava sopa aguardando meus amigos desordeiros
no outro lado da noite
este é o meu estranho emprego este mês
outro tempo quando o velho Gide se despachava para a África
meu coração era sólido eu dançava
eu assistia uma guerra de chapéus e as brancas
lacerações dos garotos no Ibirapuera angélico
terreno vazio onde eu mastigava tabletes de
chocolate branco
no próximo instante eu vi árvores e aeroplanos com bigodes
e lágrimas de Ouro
no Ibirapuera esta noite eu perdi minha solidão
ROBERTO PIVA TRANSFERIDO PARA REPARO DE VÍSCERAS
todos os meus sonhos são reais oh milagres epifanias
do crânio e do amor sem salvação que eu sabia presos
no topo da minha alma
meu esqueleto brilhava na escuridão
repleto de drogas
eu nunca estou satisfeito e ando um incorrigível demônio
lunático com os dez dedos ruídos tamborilando num campo
magnético
memória do arsênio que eu dei a uma pomba
os olhos cinzentos do céu meu culto Totem espiritual
Roberto Piva
minha memória quebrada não pode receber
o amor
eu tomava sopa aguardando meus amigos desordeiros
no outro lado da noite
este é o meu estranho emprego este mês
outro tempo quando o velho Gide se despachava para a África
meu coração era sólido eu dançava
eu assistia uma guerra de chapéus e as brancas
lacerações dos garotos no Ibirapuera angélico
terreno vazio onde eu mastigava tabletes de
chocolate branco
no próximo instante eu vi árvores e aeroplanos com bigodes
e lágrimas de Ouro
no Ibirapuera esta noite eu perdi minha solidão
ROBERTO PIVA TRANSFERIDO PARA REPARO DE VÍSCERAS
todos os meus sonhos são reais oh milagres epifanias
do crânio e do amor sem salvação que eu sabia presos
no topo da minha alma
meu esqueleto brilhava na escuridão
repleto de drogas
eu nunca estou satisfeito e ando um incorrigível demônio
lunático com os dez dedos ruídos tamborilando num campo
magnético
memória do arsênio que eu dei a uma pomba
os olhos cinzentos do céu meu culto Totem espiritual
Roberto Piva
Reformando as Utopias por José Sette
Estou chocado com a eleição e com a pseudo-ética que formaliza a democracia capitalista brasileira.
As aberrações que podemos observar na prática eleitoreira tem se mostrado incomensurável na avaliação dos candidatos concorrentes e seus partidos aproveitadores. O povo influenciado pela mídia, noticiários e programas de rádio e tevê, continua não sabendo em quem votar. Tiririca, Romário, Garotinho, Wagner Monte, são os campeões de voto, segundo as pesquisas. Antes, Clodovil, Maluf, Enéas, dominavam o cenário midiático sem nenhum benefício de suas atuações ao processo político de libertação do nosso povo.
Eles todos são os representantes do espírito brasileiro da esculhambação, da pilhéria e do mal dizer. Aliais o nosso povo quando não pode consertar ou transformar, ele tenta esculhambar, anarquizar. É o sentimento de revolta que passa na cabeça de todos nós, quando a outra opção que se tem nem é sempre o que se deseja de fato. O voto inútil. O fenômeno Cacareco faz parte disso. Acho um direito de o povo elegê-los, com todos os votos de quem quer para quem vai esculhambar o que não está direito.
Mas nisso tudo o que não é direito são os eleitores carregarem nas legendas dos partidos que apóiam os despreparados a possibilidade de com os Cacarecos seguirem todo o zoológico.
Quanto a esculhambação, meu pai me dizia que em 1939, ele assistia nos cine jornais da época, o poder da Alemanha no desfile sincronizado, harmonioso, perfeito, representados no balé bélico dos soldados nazistas com seus uniformes cortados na medida, suas calças impecáveis caindo em uma mesma posição sobre suas botas brilhando, era assustador. Mas quando um corte na imagem do cine jornal apresentava o contraponto no desfile dos seus seguidores no Brasil, onde centenas de integralistas comandados por Plínio Salgado marchavam na Avenida Rio Branco, sem nenhum sincronismo no movimento, praticamente andavam, conversavam uns com os outros, usavam diferentes sapatos esportivos, camisas verdes e calça de qualquer cor, o povo brasileiro gozador conseguia esculhambar até a rigidez do nacional socialismo alemão.
Assim o Brasil, que é feito pela mistura de todas as raças, um país sério dentro de uma desordem incontrolável, precisa de reformas urgentes e inovadoras. Parafraseando Tancredo Neves, em depoimento ao meu filme Liberdade: “brasileiro radical não existe, se ele é brasileiro, ele não é radical, mesmo ele tendo nascido no Brasil”. No mesmo filme Luis Carlos Prestes, em uma entrevista, nos diz que se um dia soldados estrangeiros invadirem o nosso território, esse povo dolente, se bem informado, vai se unir radicalmente, com coragem na inaudita luta, sem trégua, para expulsar o invasor...
É preciso mostrar a todos que nós já estamos sendo invadidos e escravizados e ninguém fala sobre isso. Essa dualidade nacional precisa ser entendida. Quando um candidato se deixa mais radical em suas opiniões ele não é entendido pelo eleitor. Mas o eleitor precisa saber o quanto invadido está sua mente, seu pensamento, seus direitos, sua vida, por forças de uma cultura estrangeiras que de maneiras claras e objetivas dominam grande parte do nosso território, tanto físico quanto mental.
Uma reforma política, se um dia existir, tem que se inovadora, tem de ser única. A verdadeira democracia tem de acabar com todos os partidos políticos. Com todo radicalismo burocráticos que dele advém.Todo brasileiro pode ser candidato, todo eleitor pode ser votado. Assim Tiririca vai com milhões de voto ser eleito, mas vai sozinho. Garotinho e Wagner Monte também.
Um partido político engessa a expressão política pois são sempre dominados por panelinhas e conchavos. Ele não elege ninguém e recebe todas as glórias e legendas? É preciso acabar com isso. Para mim, as eleições, depois de uma reforma política simples e radical, seriam assim:
1. No primeiro mês se elege os vereadores e os prefeitos. No segundo mês o governador e os deputados estaduais. No terceiro mês elege-se o presidente e os deputados federais Extingue-se a eleição para o Senado.
2. Só pode concorrer para deputado estadual quem já foi votado, eleito e cumpriu todo o mandato de vereador. Só pode concorrer para Governador quem já foi votado, eleito e cumpriu todo mandato de Prefeito. Só pode concorrer a presidência quem já foi votado, eleito e cumpriu todo mandato de governador. Não teremos candidatos à vice. Se um eleito faltar, elege-se outro.
3. Todos os meios de comunicação oferecerão a todos os candidatos o mesmo tempo de difusão de suas campanhas política. Acaba-se com a papelada e impressos de candidatos. Campanha limpa só pelos meios de comunicação.
4. Ao Senado caberá a inteligência dos estados brasileiros com dois representantes escolhidos por um colegiado a ser criado composto por representantes comprovados de expressão de sua cultura política, jurídica e artística. Ao Senado caberá legitimar as leis estabelecidas na Câmara e analisar e aprovar ou não os atos do executivo.
5. O Executivo só poderá nomear seus auxiliares; Ministros e Secretários, entre aqueles que foram eleitos deputados estaduais, federais ou se forem senadores.
6. Um Senador pode concorrer a qualquer cargo eletivo, bastando que ele cumpra todo o seu mandato no Senado.
7. Todos os mandados serão de oito anos, sem direito a reeleição.
Como podemos ver com essa reforma acabaremos com a falácia que se tornou as agremiações políticas neste país. Quando se fala em Brizola não se pensa PDT. Quando se fala em Prestes, não se pensa PCB, em Getúlio, não se pensa PTB, FHC em PSDB e nem no Serra, Lula também não pensa PT e Dilma nem se fala. Os outros se confundem no radicalismo boçal do conservadorismo e das utopias ideológicas seguindo regras pré-estabelecidas como se pertencesse a uma igreja dogmática onde a fé derruba montanhas.
Meu voto não mudaria nessa nova conjuntura. Dilma é a melhor que se apresenta. Lula foi o melhor que se apresentou, depois de Brizola. Hoje as opções para o governo do Rio e de Minas, onde eu voto, é mesmo de fazer rir... Vamos democratizar de verdade, fazendo de imediato as reformas necessárias no sistema de governo e na representação política. Reformas que deveriam defender de imediato os anseios de libertação do povo brasileiro.
Guevara sem Charuto
Uma música ótima feita em homenagem à atriz cubana Phedra de Córdoba por Luiz Pinheiro...
A Balada de Nan Goldin
Um olho roxo, um machucado em forma de coração. Pessoas bebendo, cheirando cocaína, casais na cama logo após manterem relação sexual. Detalhes de banheiros, quartos, cozinhas. Os snapshots de tom confessional e pessimista da americana Nan Goldin cunharam um estilo inconfundível e suas imagens influenciaram fortemente mais de uma geração de fotógrafos. Para o júri do Prêmio Hasselblad de Fotografia de 2007, Goldin é uma das mais influentes artistas de nosso tempo.
Questões de gênero, privacidade, pudor e tabus sociais são fortemente evidenciados em suas fotos, porém, para Goldin, a premissa do seu trabalho não é pensar sobre comportamento, sobre drogas ou sobre os desajustados do mundo. Sua câmera, como ela mesma já disse, é uma extensão do seu braço e, sua fotografia, a necessidade angustiante de reter o fluxo da própria vida. Acima de tudo, a fotografia, para Goldin, é uma atividade protetora, um ato de preservação.
Nascida em 1953, em Washington, numa família judia de classe média, desde cedo teve problemas em casa. Quando tinha 11 anos, sua irmã cometeu suicídio. Aos 14, deixou os pais e foi viver entre amigos, a quem chamava de “família estendida”. Preocupada com o fato de que as memórias de sua irmã começavam a se apagar, ela começou a tirar fotos das pessoas em torno de si, para que não desaparecessem da sua mente: "Meu trabalho é principalmente sobre a memória. É muito importante para mim que eu possa tirar fotos de todos aqueles que estão próximos a mim.”
Em 1978, já em Nova York, ela mergulha em um estilo de vida destrutivo de drogas e álcool e sua câmera registra longas noitadas e relacionamentos abusivos. Na década de 80 essas fotografias transformam-se na série The Ballad of Sexual Dependency – que, inclusive, poderá ser vista nesta edição da Bienal de São Paulo, entre 25 de setembro e 12 de dezembro.
Sobre este trabalho, ela afirma: "Não é sobre o underground nem sobre viciados e prostitutas. É sobre relacionamentos entre homens e mulheres e por que são tão difíceis. Amor vem acompanhado de violência e dor. É sempre um embate entre a autonomia e a dependência."
Nesse diário visual Goldin expõe laços íntimos, angústias e fragilidades das suas relações. Uma vida doméstica entre amores e amizades, mas envolta em tédio e solidão. “O maior significado deste trabalho é como você pode se tornar sexualmente viciado em alguém e isso não ter absolutamente nada a ver com amor”.
O relacionamento com o namorado Brian aparece em algumas fotos. Numa delas, Nan and Brian in bed, ele está nu fumando um cigarro enquanto Goldin aparece deitada atrás dele, com uma expressão de vulnerabilidade e solidão. Ela também registrou a violência do namorado na foto Nan one month after being battered.
Depois de realizadas estas fotos, a autora entendeu um outro aspecto da sua obra: “É sobre a política de gênero. O que é ser mulher, o que é ser homem, quais os seus papéis sociais. As crianças são educadas para serem inseridas nesses papéis e posteriormente isso se transforma em violência”.
Aos 5 anos de idade, Goldin decidiu que não havia nada que seus irmãos homens pudessem fazer que ela não podia. "Um amigo meu me disse que eu nasci com um coração feminista".
A cena pós-punk, gays, travestis, usuários de drogas estiveram incialmente no foco do seu trabalho. No início dos anos 90, Goldin deixa Nova York para viver em Berlim, onde cuidou de um amigo à beira da morte. Sua câmera passa a registrar o avanço da Aids que levou vários dos seus amigos. Há dez anos em Paris - sem falar francês - a fotógrafa vive praticamente isolada. "Não amo mais ninguém. Sou eu e poucos amigos."
Iniciado há 30 anos, o trabalho de Nan Goldin desconstrói os princípios da “boa foto”, virando do avesso as regras, princípios e modos de composição e enquadramento, além de subverter o que é “fotografável” trazendo à tona todas as cores e sombras de um cotidiano de anti-heróis, expondo as vísceras de uma sociedade sem esperança ou salvação.
“Se eu quero tirar uma foto, eu não me importo com a luz. Não me importo com imagens perfeitas. O que me importa é a relação com as pessoas”, afirmou.
Criticada por glamourizar o submundo e as drogas, a fotógrafa respondeu que acha abominável a idéia de “heroin chic” e seu uso para vender roupas e perfumes. Como as novas e diferentes formas de convivência humana são justamente as mais sujeitas à vigilância social, talvez por isso suas imagens tenham despertado tanto interesse e polêmica.
Ao eliminar as fronteiras entre público e privado, a fotógrafa escancara as entranhas de uma vida desgraçadamente arruinada.
Talvez a cultura do sensacionalismo e ainda do reality show dos anos 2000 tenham aumentado a identificação e o reconhecimento ao trabalho de Goldin.
Hoje, suas imagens estão nas principais coleções de arte contemporânea do mundo. No site de leilões artnet um exemplar de uma foto de Goldin custa entre U$ 3 mil e U$ 5 mil. Mas as cifras podem ser maiores, como é o caso de Kathleen at the Bowery Bar, N.Y.C. (1995), leiloada em maio último por U$ 15 mil, pela Bukowskis de Estocolmo, numa tiragem de 15. Ou Joanna laughing, L'Hotel, Paris (1999), vendida pela Phillips de Pury & Company de Londres há exato um ano, por U$ 25,7 mil, em tiragem de 3.
A mídia comercial em guerra contra Lula e Dilma
Sou profundamente pela liberdade de expressão em nome da qual fui punido com o “silêncio obsequioso”pelas autoridades do Vaticano. Sob risco de ser preso e torturado, ajudei a editora Vozes a publicar corajosamente o “Brasil Nunca Mais” onde se denunciavam as torturas, usando exclusivamente fontes militares, o que acelerou a queda do regime autoritário.
Esta história de vida, me avaliza para fazer as críticas que ora faço ao atual enfrentamento entre o Presidente Lula e a midia comercial que reclama ser tolhida em sua liberdade. O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de idéias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta.
Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando vêem seus interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como “famiglia” mafiosa. São donos privados que pretendem falar para todo Brasil e manter sob tutela a assim chamada opinião pública. São os donos do Estado de São Paulo, da Folha de São Paulo, de O Globo, da revista Veja na qual se instalou a razão cínica e o que há de mais falso e chulo da imprensa brasileira. Estes estão a serviço de um bloco histórico, assentado sobre o capital que sempre explorou o povo e que não aceita um Presidente que vem deste povo. Mais que informar e fornecer material para a discussão pública, pois essa é a missão da imprensa, esta mídia empresarial se comporta como um feroz partido de oposição.
Na sua fúria, quais desesperados e inapelavelmente derrotados, seus donos, editorialistas e analistas não têm o mínimo respeito devido à mais alta autoridade do pais, ao Presidente Lula. Nele vêem apenas um peão a ser tratado com o chicote da palavra que humilha.
Mas há um fato que eles não conseguem digerir em seu estômago elitista. Custa-lhes aceitar que um operário, nordestino, sobrevivente da grande tribulação dos filhos da pobreza, chegasse a ser Presidente. Este lugar, a Presidência, assim pensam, cabe a eles, os ilustrados, os articulados com o mundo, embora não consigam se livrar do complexo de vira-latas, pois se sentem meramente menores e associados ao grande jogo mundial. Para eles, o lugar do peão é na fábrica produzindo.
Como o mostrou o grande historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma) “a maioria dominante, conservadora ou liberal, foi sempre alienada, antiprogresssita, antinacional e nãocontemporânea. A liderança nunca se reconciliou com o povo. Nunca viu nele uma criatura de Deus, nunca o reconheceu, pois gostaria que ele fosse o que não é. Nunca viu suas virtudes nem admirou seus serviços ao país, chamou-o de tudo, Jeca Tatu, negou seus direitos, arrasou sua vida e logo que o viu crescer ela lhe negou, pouco a pouco, sua aprovação, conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que contiua achando que lhe pertence (p.16)”.
Pois esse é o sentido da guerra que movem contra Lula. É uma guerra contra os pobres que estão se libertando. Eles não temem o pobre submisso. Eles tem pavor do pobre que pensa, que fala, que progride e que faz uma trajetória ascendente como Lula. Trata-se, como se depreende, de uma questão de classe. Os de baixo devem ficar em baixo. Ocorre que alguém de baixo chegou lá em cima. Tornou-se o Presidene de todos os brasileiros. Isso para eles é simplesmente intolerável.
Os donos e seus aliados ideológicos perderam o pulso da história. Não se deram conta de que o Brasil mudou. Surgiram redes de movimentos sociais organizados de onde vem Lula e tantas outras lideranças. Não há mais lugar para coroneis e de “fazedores de cabeça” do povo. Quando Lula afirmou que “a opinião pública somos nós”, frase tão distorcida por essa midia raivosa, quis enfatizar que o povo organizado e consciente arrebatou a pretensão da midia comercial de ser a formadora e a porta-voz exclusiva da opinião pública. Ela tem que renunciar à ditadura da palabra escrita, falada e televisionada e disputar com outras fontes de informação e de opinião.
O povo cansado de ser governado pelas classes dominantes resolveu votar em si mesmo. Votou em Lula como o seu representante. Uma vez no Governo, operou uma revolução conceptual, inaceitável para elas. O Estado não se fez inimigo do povo, mas o indutor de mudanças profundas que beneficiaram mais de 30 milhões de brasileiros. De miseráveis se fizeram pobres laboriosos, de pobres laboriosos se fizeram classe média baixa e de classe média baixa de fizeram classe média. Começaram a comer, a ter luz em casa, a poder mandar seus filhos para a escola, a ganhar mais salário, em fim, a melhorar de vida.
Outro conceito inovador foi o desenvolvimento com inclusão soicial e distribuição de renda. Antes havia apenas desenvolvimento/crescimento que beneficiava aos já beneficiados à custa das massas destituidas e com salários de fome. Agora ocorreu visível mobilização de classes, gerando satisfação das grandes maiorias e a esperança que tudo ainda pode ficar melhor. Concedemos que no Governo atual há um déficit de consciência e de práticas ecológicas. Mas importa reconhecer que Lula foi fiel à sua promessa de fazer amplas políticas públicas na direção dos mais marginalizados.
O que a grande maioria almeja é manter a continuidade deste processo de melhora e de mudança. Ora, esta continuidade é perigosa para a mídia comercial que assiste, assustada, o fortalecimento da soberania popular que se torna crítica, não mais manipulável e com vontade de ser ator dessa nova história democrática do Brasil. Vai ser uma democracia cada vez mais participativa e não apenas delegatícia. Esta abria amplo espaço à corrupção das elites e dava preponderância aos interesses das classes opulentas e ao seu braço ideológico que é a mídia comercial. A democracia participativa escuta os movimentos sociais, faz do Movimento dos Sem Terra (MST), odiado especialmente pela VEJA faz questão de não ver, protagonista de mudanças sociais não somente com referência à terra mas também ao modelo econômico e às formas cooperativas de produção.
O que está em jogo neste enfrentamento entre a midia comercial e Lula/Dilma é a questão: que Brasil queremos? Aquele injusto, neocoloncial, neoglobalizado e no fundo, retrógrado e velhista ou o Brasil novo com sujeitos históricos novos, antes sempre mantidos à margem e agora despontando com energias novas para construir um Brasil que ainda nunca tínhamos visto antes.
Esse Brasil é combatido na pessoa do Presidente Lula e da candidata Dilma. Mas estes representam o que deve ser. E o que deve ser tem força. Irão triunfar a despeito das má vontade deste setor endurecido da midia comercial e empresarial. A vitória de Dilma dará solidez a este caminho novo ansiado e construido com suor e sangue por tantas gerações de brasileiros.
(*) Teólogo, filósofo, escritor e representante da Iniciativa Internacional da Carta da Terra.
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