A mídia comercial em guerra contra Lula e Dilma






Por Leonardo Boff


Sou profundamente pela liberdade de expressão em nome da qual fui punido com o “silêncio obsequioso”pelas autoridades do Vaticano. Sob risco de ser preso e torturado, ajudei a editora Vozes a publicar corajosamente o “Brasil Nunca Mais” onde se denunciavam as torturas, usando exclusivamente fontes militares, o que acelerou a queda do regime autoritário.

Esta história de vida, me avaliza para fazer as críticas que ora faço ao atual enfrentamento entre o Presidente Lula e a midia comercial que reclama ser tolhida em sua liberdade. O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de idéias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta.

Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando vêem seus interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como “famiglia” mafiosa. São donos privados que pretendem falar para todo Brasil e manter sob tutela a assim chamada opinião pública. São os donos do Estado de São Paulo, da Folha de São Paulo, de O Globo, da revista Veja na qual se instalou a razão cínica e o que há de mais falso e chulo da imprensa brasileira. Estes estão a serviço de um bloco histórico, assentado sobre o capital que sempre explorou o povo e que não aceita um Presidente que vem deste povo. Mais que informar e fornecer material para a discussão pública, pois essa é a missão da imprensa, esta mídia empresarial se comporta como um feroz partido de oposição.

Na sua fúria, quais desesperados e inapelavelmente derrotados, seus donos, editorialistas e analistas não têm o mínimo respeito devido à mais alta autoridade do pais, ao Presidente Lula. Nele vêem apenas um peão a ser tratado com o chicote da palavra que humilha.

Mas há um fato que eles não conseguem digerir em seu estômago elitista. Custa-lhes aceitar que um operário, nordestino, sobrevivente da grande tribulação dos filhos da pobreza, chegasse a ser Presidente. Este lugar, a Presidência, assim pensam, cabe a eles, os ilustrados, os articulados com o mundo, embora não consigam se livrar do complexo de vira-latas, pois se sentem meramente menores e associados ao grande jogo mundial. Para eles, o lugar do peão é na fábrica produzindo.

Como o mostrou o grande historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma) “a maioria dominante, conservadora ou liberal, foi sempre alienada, antiprogresssita, antinacional e nãocontemporânea. A liderança nunca se reconciliou com o povo. Nunca viu nele uma criatura de Deus, nunca o reconheceu, pois gostaria que ele fosse o que não é. Nunca viu suas virtudes nem admirou seus serviços ao país, chamou-o de tudo, Jeca Tatu, negou seus direitos, arrasou sua vida e logo que o viu crescer ela lhe negou, pouco a pouco, sua aprovação, conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que contiua achando que lhe pertence (p.16)”.

Pois esse é o sentido da guerra que movem contra Lula. É uma guerra contra os pobres que estão se libertando. Eles não temem o pobre submisso. Eles tem pavor do pobre que pensa, que fala, que progride e que faz uma trajetória ascendente como Lula. Trata-se, como se depreende, de uma questão de classe. Os de baixo devem ficar em baixo. Ocorre que alguém de baixo chegou lá em cima. Tornou-se o Presidene de todos os brasileiros. Isso para eles é simplesmente intolerável.

Os donos e seus aliados ideológicos perderam o pulso da história. Não se deram conta de que o Brasil mudou. Surgiram redes de movimentos sociais organizados de onde vem Lula e tantas outras lideranças. Não há mais lugar para coroneis e de “fazedores de cabeça” do povo. Quando Lula afirmou que “a opinião pública somos nós”, frase tão distorcida por essa midia raivosa, quis enfatizar que o povo organizado e consciente arrebatou a pretensão da midia comercial de ser a formadora e a porta-voz exclusiva da opinião pública. Ela tem que renunciar à ditadura da palabra escrita, falada e televisionada e disputar com outras fontes de informação e de opinião.

O povo cansado de ser governado pelas classes dominantes resolveu votar em si mesmo. Votou em Lula como o seu representante. Uma vez no Governo, operou uma revolução conceptual, inaceitável para elas. O Estado não se fez inimigo do povo, mas o indutor de mudanças profundas que beneficiaram mais de 30 milhões de brasileiros. De miseráveis se fizeram pobres laboriosos, de pobres laboriosos se fizeram classe média baixa e de classe média baixa de fizeram classe média. Começaram a comer, a ter luz em casa, a poder mandar seus filhos para a escola, a ganhar mais salário, em fim, a melhorar de vida.

Outro conceito inovador foi o desenvolvimento com inclusão soicial e distribuição de renda. Antes havia apenas desenvolvimento/crescimento que beneficiava aos já beneficiados à custa das massas destituidas e com salários de fome. Agora ocorreu visível mobilização de classes, gerando satisfação das grandes maiorias e a esperança que tudo ainda pode ficar melhor. Concedemos que no Governo atual há um déficit de consciência e de práticas ecológicas. Mas importa reconhecer que Lula foi fiel à sua promessa de fazer amplas políticas públicas na direção dos mais marginalizados.

O que a grande maioria almeja é manter a continuidade deste processo de melhora e de mudança. Ora, esta continuidade é perigosa para a mídia comercial que assiste, assustada, o fortalecimento da soberania popular que se torna crítica, não mais manipulável e com vontade de ser ator dessa nova história democrática do Brasil. Vai ser uma democracia cada vez mais participativa e não apenas delegatícia. Esta abria amplo espaço à corrupção das elites e dava preponderância aos interesses das classes opulentas e ao seu braço ideológico que é a mídia comercial. A democracia participativa escuta os movimentos sociais, faz do Movimento dos Sem Terra (MST), odiado especialmente pela VEJA faz questão de não ver, protagonista de mudanças sociais não somente com referência à terra mas também ao modelo econômico e às formas cooperativas de produção.

O que está em jogo neste enfrentamento entre a midia comercial e Lula/Dilma é a questão: que Brasil queremos? Aquele injusto, neocoloncial, neoglobalizado e no fundo, retrógrado e velhista ou o Brasil novo com sujeitos históricos novos, antes sempre mantidos à margem e agora despontando com energias novas para construir um Brasil que ainda nunca tínhamos visto antes.

Esse Brasil é combatido na pessoa do Presidente Lula e da candidata Dilma. Mas estes representam o que deve ser. E o que deve ser tem força. Irão triunfar a despeito das má vontade deste setor endurecido da midia comercial e empresarial. A vitória de Dilma dará solidez a este caminho novo ansiado e construido com suor e sangue por tantas gerações de brasileiros.

(*) Teólogo, filósofo, escritor e representante da Iniciativa Internacional da Carta da Terra.

Porque gay não vota em gay?
























Por CARLOS ALEXANDRE NEVES LIMA do blog http://carlosalexlima.blogspot.com/


Em ano de eleições os temas das Paradas Gays por todo Brasil tem sido, invariavelmente, no sentido de convidar a todos LGBTs terem conscientização na hora de votar.

O site da ABGLT tem divulgado a relação dos candidatos de todo país que concorrem, em 2010, às vagas de Deputado Estadual, Deputado Federal, Governador, Senador e Presidente da República que assinaram um compromisso com a instituição, que se eleitos, defenderiam os direitos LGBTs. Entre eles existem candidatos LGBTs e heterossexuais aliados.

Nas últimas eleições municipais – no ano de 2008 – de 80 candidatos a vereadores pelo Brasil, de orientação sexual LGBT, apenas 06 candidatos conseguiram se eleger, ou seja, algo em torno de 0,75%, bem distante do número de votos esperados daqueles especulados 10% da população brasileira:

BA - Léo Kret - PR - Vereadora - T

ES - Moacyr Sélia-Moa -PR - Vereadora - T

MA - José Itaparandi - PTB - Vereador - G

MG - Isaías Martins de Oliveira - PV - Vereador - T

MG - Sander Simaglio - PV - Vereador - G

SC - Tem Vilson José Porcíncula - PP - Vereador - G

Donde se extrai que o número de candidatos LGBTs é mínimo e ainda extremamente mais inferior o número daqueles que conseguiram se eleger.

Dos candidatos aliados heterossexuais se candidataram 138 pessoas, sendo que conseguiram se eleger 29, por conseguinte, mais de 21% dos candidatos.

Mesmo comparando os votos destinados aos LGBTs (0,75%) com os votos dados aos aliados heterossexuais (21,00%) revela-se uma grande diferença.

Por que gays não votam em gays?

Algumas pessoas alegam que seria em razão da ‘homofobia internalizada’. Homofobia internalizada significa que o sujeito passou pela vida apreendendo valores negativos em relação aos gays e que, ainda que se assuma, tais conceitos estão tão sedimentados que traz consigo inconscientemente estes valores, para si e para os outros que sejam igualmente gays. Portanto, é o fruto da estigmatização social, podendo se converter num ódio contra si próprio, o que, inconscientemente, resultaria que gays se sintam ‘inferiores’ e julguem como ‘menos’ também outros gays.

Não que inexista a homofobia internalizada e que não considere ela um fator que contribua para que gays não votem em gays, mas considero esta conclusão genérica uma desculpa simplista.

Não acho que a homofobia internalizada seja a principal razão pela qual gay não vota em gay.

No meu entender, se chegasse ao conhecimento de um eleitor gay que exista um candidato com estofa, conhecimento e seja bom o suficiente para lhe representar e exercer um cargo político, o gay votaria em candidato gay.

Mal ou bem, a média dos eleitores quer votar em alguém que seja “bom”, que realmente acredite e saiba que sua proposta o representará. Se existir um candidato gay que o eleitor confie que seja assim, ele será votado pelos LGBTs e, inclusive, pelos heterossexuais.

O problema vem no “mas”, e esse sempre surge...

Mas, apesar de tal desejo, culturalmente o eleitor brasileiro, inclusive os LGBTs, não se dá o trabalho de buscar um candidato que atenda as suas expectativas, dentro do perfil idealizado. Escolhe aquele que lhe vem à mão, que os dados lhes sejam facilmente fornecidos e, neste 'reduzido universo', exista alguma empatia. A falta de esforço para escolher candidatos faz com que seja suficiente para eleger aquele minimamente conhecido pelo mesmo.

O candidato que ouvimos suas posições pela televisão, rádio ou outro veículo qualquer, o político que aparece mais na mídia, possuir mais propagandas ou mesmo que mais se ouvir falar no trabalho, residência ou lazer acabam ganhando, por falta de outra opção, o voto “consciente” do eleitor.

Não foi difícil eleger a Deputado Federal, nas últimas eleições em São Paulo, Clodovil, apesar de gay. Aliás, provavelmente seu eleitorado foi quase por unanimidade heterossexual. Os seus eleitores certamente adoravam suas críticas ácidas em seu programa de televisão. Isto bastava para a identificação e o voto. O eleitor conhecia e gostava daquilo que o candidato representava para ele. O mesmo ocorrerá com jogadores de futebol e outros que a mídia sempre dá destaque. E este voto, mesmo que muitos estejam esperneando, será tido como ‘consciente’, pois o eleitor do tal jogador é um leitor e expectador de tudo aquilo que o mesmo fala, além disto, ele não conhece a maioria dos outros candidatos.

Não é à toa que o eleitorado brasileiro aplaude de pé a ‘Ficha Limpa’. Ele quer o candidato limpo, só não deseja ter que procurar quem o seja.

Se de um lado o eleitor não busca a cartela de candidatos existentes com todos os seus dados e qualificações para escolher democraticamente aquele que realmente seja o seu “melhor”, por outro lado, aqui especialmente falando dos LGBT, estes candidatos também não conseguem realmente se fazer anunciar para os seus potenciais eleitores.

As ONGs LGBTs locais deveriam servir de ponte, mas mesmo elas possuem um número absurdamente ínfimo de associados.

As Paradas Gays, apesar de alguns esforços para tentar levar a conscientização política, representam antes de qualquer coisa, no imaginário daqueles lgbts que as frequentam, uma grande festa. Nem gosto de imaginar em qual colocação de importância estaria a política para aquelas milhões de pessoas que estão presentes a Parada Gay de São Paulo, por exemplo.

No Rio de Janeiro nem há esta preocupação. A coordenação da Parada Gay no Rio resolveu transferir a Parada para após as eleições e é, diga-se de passagem, o local onde possui como candidato ao Senado Federal um dos maiores inimigos dos direitos LGBTs de todo o país, Marcelo Crivella.

É fácil constatar a razão pela qual o casamento homossexual foi aprovado na Argentina. Lá, diferente daqui, houve um grande levante participativo. Inúmeros vídeos, campanhas publicitárias com apoio de artistas famosos, esclarecimentos públicos que os conduziram a conscientização, a mobilização popular e aprovação da lei.

Na minha modesta forma de pensar a razão pela qual gay não vota em gay nas eleições ocorre, principalmente, por falta do imprescindível acesso à informação, com real divulgação junto ao público LGBT, fora dos muros da minguada militância.

A própria página da ABGLT, única a informar candidatos comprometidos com a causa, reforça esse hábito ignorante do eleitor brasileiro. Lá não possui o curriculo do candidato, apenas se é lgbt ou aliado. O LGBT infelizmente que não deseja pesquisar sobre o candidato, e apesar da sua preguiça, dificilmente votará em algum candidato apenas por conta da sua orientação sexual. Entre um candidato heterossexual de quem ouviu alguma coisa e um ilustre desconhecido LGBT, a tendência será votar naquele que possui alguma referência, ainda que seja absolutamente rasa.

Os LGBTs, até pela necessidade, precisam amadurecer a importância da cidadania e aprenderem, ainda que antes da sociedade em geral, a ultrapassar os costumes culturais, já enraizados, que os tornam inertes.

Mas mesmo sem desconsiderar a péssima cultura do eleitor brasileiro de não buscar essas informações e apesar de algumas ações pontuais, as Associações LGBTs têm sido absolutamente incompetentes. São partidárias quando jamais deveriam ser e se colocam propositalmente inacessíveis ao LGBT “não militante”, para manter sempre os mesmos no ‘pseudo poder’. Não se dão ao trabalho para atingir e efetivamente impulsionar a população de lésbicas, gays, bissexuais e transexuais. Essas associações esqueceram que não se bastam ou preferem qua assim seja por razões que não atendem as verdadeiras prioridades da população LGBT.

O medo da fêmea diante da balança por Xico Sá







































Você, amigo, sai com a pequena e ela só belisca, qual um passarinho, uns saudáveis farelos ou engole umas folhinhas sem graça. Que desgosto. Você caprichou na escolha do restaurante, acordou com água na boca por um prato que só você sabe onde encontrá-lo, quer fazer uma presença, fazer bonito com a cria da sua costela.
 Que desgosto, a gazela mira o ambiente com “nojinho”, de tão fresca. Uma estraga-prazeres, eclipse de um belo sabadão ensolarado.
 Ah, nada mais bonito do que uma mulher que come bem, com gosto, paladar nas alturas, lindamente derramada sobre um prato de comida, comida com sustança. Os olhinhos brilham, a prosa desliza entre a língua, os dentes, sonhos, o céu da boca. Ela toma uma caipirinha, a gente desce mais uma, sábado à tarde, nossa doce vida, nossos planos, mesmo na velha medida do possível.
Pior é que não é mais tão fácil assim encontrar esse tipo de criatura. Como ficou chato esse mundo em que a maioria das mulheres não come mais com gosto, talher firme entre os dedos finos, mãos feitas sob medida para um banquete nada platônico.
 Época chata essa. As mulheres não comem mais, ou, no mínimo, dão um trabalho desgraçado para engolir, na nossa companhia, alguma folhinha pálida de alface. E haja saladinha sem gosto, e dá-lhe rúcula!
A gente não sabe mais o que vem a ser o prazer de observar a amada degustando, quase de forma desesperada, um cozido, uma moqueca, uma feijoada completa, uma galinha à cabidela, massa, um chambaril, um sarapatel, um cuscuz marroquino/nordestino, um cabrito, um ossobuco, um bife à milanesa, um tutu na decência, mocotó, um baião de dois, uma costela no bafo, abafa o caso!
Foi embora aquela felicidade demonstrada por Clark Gable no filme ''Os Desajustados'', quando ele observa, morto de feliz, Marilyn Monroe devorando um prato de operário. E elogia a atitude da moça, loa bem merecida.
Além do prazer de vê-las comendo, pesquisas recentes mostram que as mulheres com taxas baixíssimas de colesterol costumam ser mais nervosas, dão mais trabalho em casa ou na rua, barraco à vista, intermináveis discussões de relação... Nada mais oportuno para convencê-las a voltar a comer, reiniciá-las nesse crime perfeito.
Moças de todas as geografias afetivas e gastronômicas, aos acarajés, às fogazzas, aos pastéis, aos cabritos assados e cozidos, ao  sanduíche de mortadela, à dobradinha à moda do Porto, ao lombo -de lamber os lábios!-, ao churrasco de domingo para orgulho do cunhado que capricha na carne e sabe a arte de gelar uma cerva. E aquela fava, meu Deus, com charque, enquanto derrete a manteiga de garrafa, último tango do agreste.
O importante é reabrir o apetite das moças, pois, repito, senhoras e senhores, o velhíssimo mantra: homem que é homem não sabe sequer -nem procura saber- a diferença entre estria e celulite.
Até a próxima e desejo a todas as mulheres um final de semana com  muita gula e todos os pecados capitais possíveis. Sem culpa, meninas!

Fidel Castro sai do armário





























«A própria beleza é perigosa em si, conflituosa para toda ditadura, porque implica um âmbito que vai além dos limites em que essa ditadura submete os seres humanos; é um território que escapa ao controle da polícia política e onde, portanto, não pode reinar. Por isso mesmo, irrita todos os ditadores, que querem destruí-la de qualquer maneira. A beleza sob um sistema ditatorial é sempre dissidente, porque toda ditadura é por si mesma antiestética, grotesca; praticá-la representa, para o ditador e seus agentes, uma atitude escapista ou reacionária.»  Reinaldo Arenas (1943-1990), escritor cubano

Numa entrevista publicada no último 31 de agosto no jornal on-line «La Jornada», o ditador cubano Fidel Castro assumiu que houve perseguição estatal a homossexuais, sendo que muitos foram para prisões e campos de concentração. Grande novidade! Tudo isso já foi mais que documentado e testemunhado pelos milhares de homossexuais cubanos exilados, como foi o caso do escritor Reinaldo Arenas.

E se não bastasse, muitos militantes da esquerda folclórica estão bajulando o monstro das Antilhas, ao dizer que foi corajoso. Não acredito nas palavras desse senhor. Um inimigo do seu povo, um oportunista que se manteve 49 anos no poder e levou seu país para uma ditadura igual ou pior que a antecessora. E tem gente que diz que os cubanos mais ganharam que perderam com os irmãos Castro...

Diga-se de passagem, há um erro na declaração do senhor Fidel Castro. Não foi somente nas décadas de 1960 e 1970 que o governo cubano perseguiu homossexuais. Como Reinaldo Arenas deixou registrado em «Antes que anochezca», no início dos anos 1980 Fidel Castro queria ficar livre dos degenerados (escritores, artistas, prostitutas, homossexuais). O episódio ficou conhecido como «marielitos». Um adendo: uma equipe formada por psicólogos fazia testes bizarros para descobrir se o sujeito de fato era gay, seja pela vestimenta, forma de andar, ou até preferência sexual – se disse que era exclusivamente ativo nas suas relações sexuais, poderia ter seu pedido negado.

E o «excelentíssimo» caribenho faz caras e bocas e pede perdão pelos crimes contra a humanidade e quer ficar por isso mesmo. É um otário! Um mísero pedido de perdão não trará de volta os milhares de LGBTs que foram assassinados ou se mataram, por não suportar tanto sofrimento. Acrescenta-se ainda o fato de o mesmo chefe de Estado empurrar parte de seus compatriotas para o exílio. É lema «Cuba: ame-a ou deixe-a». Parece algo familiar?

O Grupo Gay da Bahia acionará Fidel Castro no tribunal de Haia pelos crimes cometidos contra LGBTs. Boa tentativa, embora acredite que acabará em pizza mesmo. Primeiro, porque a ONU é uma instituição inservível, que mais prestou desserviço do que benefício à humanidade. Veja os últimos 20 anos: os conflitos em Ruanda, os massacres na Bósnia, o terrorismo, a guerra do Iraque, a AIDS (ou SIDA), os empréstimos financeiros a governos ditatoriais e corruptos... Nada se compara as macaquices de tal organização. Sou cético ainda, pois acredito que a Corte Internacional de [in]Justiça é comandada por um bando de bundões (desculpe, caros leitor e leitora) que não têm a audácia de julgar um ditador que é paparicado por parte da intelectualidade terceiro-mundista.

E Fidel Castro não cometeu crimes somente contra LGBTs, mas contra a humanidade. Como dizem, malandro às vezes fala a verdade. Só falta agora o digníssimo soberano das Caraíbas assumir as milhares de vidas humanas ceifadas pela Revolução Cubana. Terá Fidel Castro tamanha hombridade?

Texto extraido do blog http://qlibertarios.blogspot.com

Aquela criança de sempre - Reinaldo Arenas







































Sou esse menino desagradável,
sem dúvida inoportuno,
de cara redonda e suja,
que fica nos faróis,
onde as grandes damas tão bem iluminadas,
ou onde as meninas que parecem levitar,
projetam o insulto de suas caras redondas e sujas.

Sou uma criança solitária,
que o insulta como uma criança solitária,
e o avisa:
se por hipocrisia você tocar na minha cabeça,
aproveitarei a chance para roubar-lhe a carteira.

Sou aquela criança de sempre,
que provoca terror,
por iminente lepra,
iminentes pulgas, ofensas,
demônios e crime iminente.

Sou aquela criança repugnante,
que improvisa uma cama de papelão
E espera, na certeza,
que você me acompanhará.

A urgência da democratização das comunicações no país

Por Ivan Valente

Retirado do programa da candidata do governo aquilo que a imprensa considerou “prática de censura” ou um “atentado à democracia” brasileira, a pauta das comunicações simplesmente desapareceu da cobertura da imprensa neste processo eleitoral. Nenhuma linha sobre políticas públicas sobre o setor, sobre novas leis para regular o mercado, nenhum questionando aos candidatos que disputam a liderança nas pesquisas sobre seu compromisso com avanços nesta área – seja do acesso à banda larga aos critérios para a distribuição da verba publicitária do Poder Executivos.

Esta postura dos grandes meios de comunicação não é nenhuma novidade, mas não deixa de ser lamentável. Historicamente, as decisões sobre a mídia em nosso país foram tomadas sem a participação democrática da sociedade, em grande parte porque a população sequer é informada sobre este seu direito. Nem durante as eleições. Um dos resultados é um cenário de grande concentração da propriedade dos meios e pouca pluralidade e diversidade na mídia. São pouquíssimas vozes falando e milhões ouvindo.

Mas o momento eleitoral é fundamental para pautar na sociedade brasileira a necessidade de mudanças no sistema de comunicações no país. Uma delas é a urgência de um novo marco legislativo para o setor, que passe pela regulamentação dos artigos da Constituição Federal que tratam do tema. Entre eles, o artigo 220, que proíbe o monopólio das comunicações no país. Para contribuir com esta discussão, nosso mandato apresentou no ano passado um Projeto de Lei que proíbe a propriedade cruzada dos meios de comunicação, de forma a limitar de forma horizontal e vertical a propriedade das empresas que atuam na cadeia produtiva da mídia brasileira.

É do PSOL também a Ação Direta de Inconstitucionalidade movida contra o Decreto 5.820/2006, que instituiu o Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD), que apesar de derrubada pelos ministros do STF, foi considerada procedente pela Procuradoria Geral da República. A PGR, como nós, entendeu que a transmissão em sinal digital deveria ser considerada um serviço diferente da transmissão analógica, para o qual seria necessário, portanto, a abertura de um novo processo de concessão de outorgas. Tal processo deveria então passar também pelo Poder Legislativo, o que foi ignorado pelo Decreto 5820. E mais: ao definir para o país um sistema que privilegia a transmissão em alta definição, o decreto jogou fora a possibilidade de ampliar o número de canais na televisão aberta, permitindo, por exemplo, que os canais públicos encontrassem espaço no espectro já congestionado de cidades como Rio de Janeiro e São Paulo.

O novo modelo institucional também deve afirmar o direito à comunicação como um dos pilares de uma sociedade democrática. É urgente garantir o direito de todas as pessoas de ter acesso aos meios de produção e veiculação de informação, de possuir condições técnicas e materiais para ouvir e ser ouvidas e de ter o conhecimento necessário para estabelecer uma relação autônoma e independente frente aos meios de comunicação. E a garantia deste direito é dever do Estado, que tem a responsabilidade de assegurar sua promoção.

O processo eleitoral é um espaço privilegiado para a afirmação desses princípios e deveres e, conseqüentemente, uma oportunidade para o avanço da luta pela democratização da mídia e pela ampliação da participação popular na construção das políticas públicas de comunicação. Tudo isso sem temer conflitos com aqueles que historicamente ajudaram a consolidar o vergonhoso monopólio característico do setor e que, durante o último governo, tiveram seus privilégios intocados.

Numa entrevista ao programa Roda Viva, o então ministro das Comunicações Hélio Costa, reafirmou, por exemplo, a resistência do governo federal à institucionalização de mecanismos de controle social das comunicações. Tema caro e reivindicação histórica daqueles que lutam pela democratização da mídia, o controle social é afirmado como ameaça à liberdade de expressão das empresas – as mesmas que, historicamente, são responsáveis para que a voz dos excluídos jamais seja ouvida no debate público.

É preciso afirmar que não são as empresas de comunicação que têm sua liberdade ameaçada, e sim os movimentos populares que querem a transformação do país. Em São Paulo, todos os meses vemos lideranças do movimento de rádios comunitárias criminalizadas e emissoras populares, caladas. Em alguns casos, a Polícia Civil do governo tucano de São Paulo – que sequer tem prerrogativa para atuar neste campo – tem participado de ações de fechamento das rádios. É mais uma prova da truculência com que o Estado brasileiro, em todas as suas esferas, ainda trata defensores da real liberdade de expressão.

Esperamos ainda que estas eleições apontem para uma mudança no perfil dos parlamentares do Congresso Nacional. Não basta apenas garantir a reeleição daqueles que são comprometidos com a luta pela democratização das comunicações – tão bem lembrados pela Caros Amigos em sua edição especial sobre as eleições. Será preciso impedir que aqueles que, atendendo a interesses particulares, sejam reconduzidos ao Congresso e sigam fazendo das concessões de rádio e televisão uma moeda de troca de favores políticos, e da nossa comunicação uma mercadoria a ser negociada por aqueles que detêm o poder político e econômico no país.

A gravidade desta situação é enorme. Um estudo do Laboratório de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília revelou que 37,5% dos membros titulares da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara e 47% dos titulares da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado são proprietários de emissoras de Rádio e TV ou têm familiares controladores destes tipos de veículos de comunicação. Levantamento feito pelo Professor Venício Lima também analisou a presença de parlamentares radiodifusores nas comissões e sua atuação em causa própria nos anos de 2003 e 2004, e detectou que deputados participaram e votaram favoravelmente nas renovações de suas próprias concessões.

Esta prática precisa acabar. Um dos maiores desafios na luta por um Estado democrático e para a realização plena de uma sociedade justa, sem opressões, é o resgate do ambiente da mídia como espaço público, desprivatizando-o mediante a inclusão progressiva de todos os atores sociais. Que a escolha feita pelo eleitor no próximo dia 3 de outubro crie as condições para um processo real de transformação neste campo, que dê voz ao nosso povo e força à nossa democracia.

Ode à Salvador Dalí - Frederico Garcia Lorca

























Uma rosa no alto do jardim que tu desejas.
Uma roda na pura sintaxe do aço.
Desnuda a montanha de névoa impressionista.
Os grises observando suas balaustras ultimas.

Os pintores modernos, em seus brandos estúdios,
cortam a flor asséptica da raiz quadrada.
Nas águas do Sena um iceberg de mármore
esfria as janelas e dissipa as eras.

O homem pisa forte nas ruas lajeadas.
Os cristais se esquivam da magia e do reflexo.
O governo fechou as lojas de perfume.
A máquina eterniza seus compassos binários.

Uma ausência de bosques, biombos e sobrecenhos
erra pelos telhados das casas antigas.
O ar pule seu prisma sobre o mar
e o horizonte sobe como um grande aqueduto.

Marinheiros que ignoram o vinho e a penumbra
decapitam sereias nos mares de chumbo.
A Noite, negra estátua da prudência, tem
o espelho redondo d lua em sua mão.

Um desejo de formas e limite arrebatada.
Vem o homem que olha com o metro amarelo.
Vênus é uma branca natureza morta
e os colecionadores de mariposas fogem.

***

Cadaqués, no fiel da água e da colina,
eleva escalinatas e oculta caracóis.
As flautas de madeira pacificam o ar.
Um velho Deus silvestre dá frutas aos meninos.

Seus pescadores dormem, sem sonho, na areia.
Em alto-mar lhes serve de bússola uma rosa.
O horizonte virgem de lencinhos feridos
junta os grandes vidros do peixe e da lua.

Uma dura coroa de brancos bergantins
cinge frontes amargas e cabelos de areia.
As sereias convencem, mas não sugestionam,
e saem mostrando um copo de água doce.

***

Alma higiênica, vives sobre marmores novos.
Foges à escura selva de formas incríveis.
Tua fantasia chega onde chegam tuas mãos,
e gozas o soneto do mar em tua janela.

O mundo tem surdas penumbras e desordem,
nos primeiros términos que o humano frequenta
Porém já as estrelas ocultando paisagens
assinalam o esquema perfeito de suas órbitas.

A corrente do tempo se remansa e se ordena
nas formas numéricas de um século e outro século.
E a Morte vencida se refugia tremendo
no circúloestreito do minuto presente.

Ao pegar tua palheta, com um tiro em uma asa,
pedes a luz que anima a copa da oliveira.
Larga luz de Minerva, construtora de andaimes,
onde não cabe o sonho nem sua flora inexata.

Pedes a luz antiga que fique na frente,
sem baixar a boca nem o coração do homem.
Lua que temem as vides estranháveis de Baco
e a força sem ordem que leva a água curva.

Fazes bem em pôr bandeirolas de aviso,
no limite escuro que relumbra a noite.
Como pintor não queres que te abrande a forma
o algodão cambiante de uma nuvem imprevista.

O peixe no aquário e o pássaro na gaiola.
Não queres inventa-lo no mar ou no vento.
Estilizas ou copias depois de ter olhado
com honestas pupilas seus corpinhos ágeis.

Amas uma máteria definida e exata
onde o fungo não possa armar acampamento.
Amas a arquitetura que constrói no ausente
e admites a bandeira como uma simples pilhéira.

Diz o compasso de aço seu curto verso elástico.
Desconhecidas ilhas já a esfera.
Diz a linha reata seu vertical esforço
e os sábios cristais cantam suas geometrias.

***

Mas também a rosa do jardim onde vives.
Sempre a rosa, sempre, norte e sul de nós!
Tranquila e concentrada como uma estátua cega,
ignorante de esforços soterrados que causa.

Rosa pura que limpa de artifícios e esboços
e nos abre as asas tênues do sorriso.
(Mariposa pregada que medita seu vôo.)
Rosa do equilíbrio sem dores buscadas.
Sempre a rosa!

***

Oh! Salvador Dalí, de voz azeitonada!
Digo o que me dizem a tua pessoa e teus quadros.
Não te louvo o imperfeito pincel adolescente,
mas canto a firme direção das tuas flechas.

Canto teu belo esforço pelas luzes catalãs,
teu amor ao que tem explicação possível.
Canto teu coração astronômico e terno,
de baralha francesa e sem nenhuma ferida.

Canto a ânsia de estátua que seus personagens sem trégua,
o medo à emoção que te aguarda na rua.
Canto a sereiazinha do mar que te canta
montada na bicicleta de corais e conchas.

Mas antes de tudo canto um comum pensamento
que nos une nas horas escuras e douradas.
Não a Arte a luz que nos cega os olhos.
É primeiro o amor, a amizade e a esgrima.

É primeiro o quadro que paciente desenhas
o seio de Tereza, a de cútis insone,
o apertado cacho de Matilde, a ingrata,
nossa amizade pintada como um jogo de oca.

Sinais datilográficos de sangue sobre o ouro
risquem o coração da Catalunha eterna.
Estrelas como punhos sem falcão te relumbram,
enquanto tua pintura e tua vida florescem.

Não olhes a clepsidra com asas membranosas,
nem a dura gadanha das alegorias.
Veste e desnuda sempre o teu pincel no ar,
ante o mar povoado com barcos e marinheiros.

Um uivo em memória de Reinaldo Arenas - Caio Fernando Abreu

























Acaba de ser lançado no Brasil um dos livros mais belos que conheço: Antes que anoiteça (Editora Record), autobiografia do cubano Reinaldo Arenas. “Belo” não seria o adjetivo exato. Pungente talvez, pois comove e rasga. Destemido, dilacerado, desesperado e sobretudo vivo de vida pulsante, sangrenta. Em chagas, tão impudicamente exposto. Mas adjetivos pouco importam. Importa o livro, a vida crua que ele revela.
Encontrei Reinaldo numa madrugada de novembro de 1992 em Saint-Nazaire, cidade francesa entre Nantes e Brest, exatamente onde o rio Loire chega ao mar, fronteira sul da Bretanha. Aparentemente anódina, sinistrée durante a Segunda Guerra (numa noite, restaram cinco mil dos 8o mil habitantes), depois reconstruída pelos americanos, Saint-Nazaire é, contudo, mágica a ponto de ter um dólmen druídico na praça central. Num décimo segundo andar, a prefeitura socialista e a editora Arcane 17 mantêm a Maison des Écrivains Étrangers, que oferece bolsas a escritores do mundo todo durante dois ou três meses, para que deixem um livro à memória da cidade. Por lá passaram o argentino Ricardo Piglia, o búlgaro Victor Paskov, o espanhol Luis Goytisolo e pelo menos mais uns 20 checos, escandinavos, chineses. Nesse tempo de que falo, por partes de minha tradutora Claire Cayron, era eu o hóspede.
Foi numa noite de tempestade, loucas gaivotas batiam-se contra as vidraças do terraço. Insone fiquei lendo Méditations de Saint -Nazaire, de Arenas, que só vagamente conhecia (Celestino antes dei alba, El mundo alucinante). Impressionado com o texto, decorei suas últimas palavras: “Aún nossie ete El sitio dondeyo puedavivir. Talvez para um desterrado — como la palabra lo indica — no hayasitio en la Tíerra. Sólo quiera pedirle a ete cielo resplandecientey a este mar, que poruno días aúnpodré contemplar, que acojan mi terror”. Repeti feito oração, e dormi. Acordei ouvindo o ruído da máquina de escrever do escritório. Fui até o corredor, espiei. Em frente à janela, um homem moreno contemplava a tempestade enquanto escrevia. Parecia chorar. Estremeci, ele desapareceu. Tô pirando, pensei. E voltei a dormir.
Pela manhã contei a história a Christian Bouthemy, poeta e editor da Arcane 17. Descrevi o homem. Parece Reinaldo Arenas, ele lembrou, que ficara por lá apenas uma semana da temporada de dois meses. Estava com aids, tinha medo de se jogar pela janela. Preferiu voltar a Nova York e suicidar-se com uma overdose de barbitúricos e álcool, depois de concluir sua autobiografia, este Antes que anoiteça. Consegui o livro em francês e em Paris, num quartinho alugado com Dominique Bach, produtora da cantora cabo-verdiana Cesária Évora, durante um fevereiro gelado, no coração da barra pesada de Château d’Eau, mastiguei suas últimas palavras como se fossem cacos de vidro. Não suportava ler, nem conseguia parar. Jamais sofri tanto com um livro — nem mesmo Fome, de Knut Hamsum, ou A morte de Ivan Ilitch, de Tolstói.
Leiam também vocês se não têm medo da dor e da verdade. Censurado, perseguido e preso em Cuba por homossexualismo, Arenas fugiu para Miami, primeira estação do seu calvário de solidão e exílio, dedicando-se a desmascarar figurões tipo García Márquez, Severo Sarduy, Eduardo Galeano, Julio Cortázar e outros asseclas de Fidel Castro, que odiava. Livra a cara de pouco — Lezama Lima e Virgilio Piuiera, malditos (e grandes) como ele. Transbordava amor: à vida, aos rapazes, à literatura.
Voltando ao Brasil, tentei traduzi-lo. Ninguém quis. Muito deprimente, diziam, pouco comercial. Mas como o Deus das Laikas (e Arenas foi a maior de todas) tarda mas não falha, saiu agora. Leiam. Pelo bravo homem que ele foi, e também para aprender a valorizar o que se tem, mas não se preza. Depois uivem para o infinito em memória desse cubano lindo, desventurado, heróico.
Requiem scat in pace, hermoso compafíero.

O Estado de S Paulo, 27/11/1994

INTEGRAR-SE OU DESINTEGRAR? por João Silvério Trevisan.



Integrar-se ou desintegrar, eis a questão. Percorro o meio homossexual e não canso de me deparar com situações surpreendentes. Não, não vou falar de pegação (ou açougue) nos cinemas, parques e saunas -- não desta vez. Num debate promovido pelo CAEHUSP, dentro do seu ciclo de mesas redondas sobre homossexualidades, ouvi uma conversa que foi entusiasmando o público na mesma proporção em que ia me deixando de cabelos em pé. Como havia uma vereadora presente, alguém propôs com eloquência que ela encaminhasse junto à Câmara dos Vereadores de São Paulo os projetos de: 1) determinar uma praça para as bichas caçarem à vontade (sugeriu-se a Praça Roosevelt, pela proximidade de vários outros points gueis); 2) batizar ruas e criar monumentos com nomes de bichas e lésbicas eméritas. "Meu Deus, se mencionarem o meu nome, onde vou me esconder?" -- pensei, aterrorizado ante a possibilidade de estar entre as bichas eméritas.
Não iria me esconder por timidez. É que eu execro monumentos de qualquer tipo, a qualquer pessoa. Na década de 70, quando morava no México, fiz meu único poema em espanhol, em homenagem a García Lorca, amaldiçoando as pedras dos monumentos feitos sobre nossos cadáveres, depois que nos atiraram pedras a vida toda. Mais recentemente, quase criei sérios problemas político-familiares quando o prefeito de minha cidade natal quis criar um centro cultural com o meu nome. Considerando que era período eleitoral, o centro seria inaugurado sem qualquer infra-estrutura, para ser fechado em seguida, e eu me sentiria manipulado. Mas, sobretudo, pesava a incongruência da minha situação: prestes a ser despejado do meu apartamento, sem dinheiro e solitário num país de merda -- mas com meu nome na fachada de um centro cultural!... Ou seja, tem algo de podre no reino da Dinamarca.
Querem nos prestar homenagem? Pois que seja em vida, aqui e agora, sem motivo especial: a maior homenagem é nos deixar viver do jeito que somos, queremos e merecemos pelo que fizemos. Ou seja, reconhecimento real e não hipocrisia para descarregar consciências pesadas. Por isso, no tal debate, a convicção com que se reivindicava a consagração do gueto me pareceu uma burrice suprema. Ao contrário do que se pensava, não havia nisso libertação, mas confinamento: pode-se trepar, contanto que seja ali. Ora, faça um exercício de imaginação para pensar no que não nos estaria sendo pedido em troca, pois nada nos é dado de graça -- sejamos nós pobres ou pretos ou homossexuais ou, de algum modo, parte daquele grupo de cidadãos de segunda catergoria, tratados como a escória neste país de banqueiros e ruralistas. Ou não é ser escória ouvir piadinhas, amar clandestinamente, ter que esconder metade da sua vida, etc, etc. etc.?
(Sei que cada um de vocês pode fazer, por experiência própria, sua lista da repressão quotidiana que nos impingem.) Pra mim, um fato é certo: não preciso que determinem um lugar onde eu possa caçar, simplesmente porque quero caçar em qualquer lugar da cidade. E quanto aos monumentos, recuso ser cooptado depois de morto. Vivo incomodando e tenho pago (alto) preço por isso: apesar de extremamente intensa e criativa, graças ao meu esforço, minha vida é cheia de dificuldades e humilhações (recentemente um jornal devolveu um artigo que eu, com 52 anos, escrevera a seu pedido; e me pagou -- para não publicar; tema: homossexualidade). Portanto, prefiro que a sociedade -- que me puniu por ser bicha, pensar com a própria cabeça e escrever criativamente -- continue me tendo atravessado em sua garganta, mesmo quando eu já for cadáver. Por que não pensar maior, para além do gueto? Criar, tirar do nada, inventar, não é o que fazemos a vida inteira?
A partir de espaços rarefeitos e emoções recônditas, criamos e inventamos o nosso mundo incessantemente, para poder sobreviver no exílio em que nos meteram. Ou será que a discriminação que sofremos é apenas um faz-de-conta de gente mimada (que só pensa em trepar, como se diz por aí, a nosso respeito)? Será que não é prova de burrice sonhar em integrar-se na mesma sociedade injusta que nos oprime? Será que tudo o que queremos é partilhar da mesma mediocridade que nos empurra para as margens? Ah, a margem! Eis o ponto. Por menos que seja, o nosso grande trunfo é o olhar das margens que fomos obrigados a desenvolver. É esse olhar que nos fornece instrumentos para exercer a crítica à cultura e é graças a ele que podemos sonhar com (talvez propor) um mundo diferente. Nossa "doença" é o melhor que temos. Caso contrário, seria preferível casar, ter filhos e virar "saudáveis" executivos -- como fazem muitos "homens de bem", ainda que continuem freqüentando saunas de viado, às escondidas.
Integração? Não, obrigado. A sociedade tem que aprender não com nossa saúde forjada, mas com nossa "doença" -- aquilo que ela considera doença, porque a assusta e coloca em crise. Afinal, somos "doentes" quando ousamos transgredir, arriscando muito, quase tudo. E transgredir em nome de valores que estão muito acima da mediocridade medida pelo preço do mercado. Não é graças a esses valores que conseguimos sobreviver afetivamente no deserto, cavando com as próprias mãos o nosso amor e a nossa fé, todos os dias? Pois é com isso também -- nossa "doença"-- que construímos nossa singularidade individual. Portanto, chega de palavras-de-ordem, seja na publicidade que nos manda comprar para ser belos (consumir para ser mais consumível), seja nos discursos revolucionários de algibeira, ansiosos por substituir os ocupantes atuais do trono. Melhor, isso sim, tomar posse da nossa homossexualidade como um trampolim para a desintegração.
Desintegrar, por exemplo, equívocos como aquele do masculino baseado no culto fálico e na sua própria falta de saída. (Esse é um outro papo, a crise do masculino -- da qual as bichas somos ponta de lança, quando exacerbamos as contradições masculinas.) Se temos uma função social própria, essa é desintegrar. Somos mestres em desintegrar, já que vivemos da desintegração. Nós construímos não contra ela mas graças a ela. Aprendemos a viver em meio aos fragmentos que nos deixaram sobrar. Os negros brasileiros sabem do que estou falando: pensem na feijoada, hoje prato nacional, criada pelos escravos com os restos de comida que recebiam. No caso homossexual, a singularidade está na repressão que sofremos desde pequenos. Pode parecer pouca porcaria. Mas não é. A sociedade, tal como constituída, dificilmente poderá nos aceitar em seu seio -- a menos que ela mude, coisa comprovadamente difícil; ou que mudemos nós -- tal como já fizeram milhares de pessoas no decorrer da História.


Essas são as duas alternativas possíveis. E digo por que a sociedade não pode nos engolir. Por mais que proliferem os bares, as danceterias, as saunas, os desfiles de moda, as peças/filmes/exposições e até mesmo os espaços na mídia, estaremos sempre sob vigilância estrita -- porque somos basicamente condenáveis. Socialmente, vivemos num ilusório bolsão de tolerância. Ou será que, na reforma constitucional brasileira você viu a esquerda votando a favor da opção sexual como um direito do cidadão? Será que já ouviu D. Evaristo Arns, o cardeal que adora ficar do lado dos oprimidos, reconhecer a opressão aos homossexuais? Será que você conhece algum organismo internacional ligado à ONU que defenda os direitos homossexuais no mesmo grau de legitimidade com que brande os direitos dos negros, das crianças, das mulheres, dos índios, etc.? Não. E duvido que vá conhecer tão breve.
Pelo mesmo motivo que até hoje não permitiu indenização aos homossexuais vítimas do nazismo, como aconteceu com outros grupos, fossem eles judeus, políticos e até mesmo ciganos. Ou pelo motivo que leva os delegados brasileiros a engavetar sistematicamente os casos de assassinatos de homossexuais. Será que você nunca notou o constrangimento mal disfarçado das campanhas contra a Aids, no tempo em que isso era basicamente doença de viado (que dá o cu, como o Paulo Francis fazia questão de frisar)? O motivo é simples. Para a atual sociedade moderninha, mesmo quando não afirma em voz alta, nós ainda significamos um bocado de coisas abomináveis. Eu poderia citar uma penca delas. Mas vamos nos concentrar apenas no denominador-comum que perpassa todas as condenações, discriminações ou omissões conhecidas: o prazer. Nós horrorizamos o mundo porque nossa grande reivindicação repousa sobre a liberdade de amar, um amor não procriativo, que visa apenas o prazer.
Você poderá dizer que hoje isso não é privilégio nosso, já que a sociedade moderna assenta-se sobre o hedonismo e o consumo. Engano, pois o nosso prazer passa por outro viés: o do estigma historicamente consagrado-- como já analisei na SG nº 23. Nosso prazer é ultrajante. Está lá na Bíblia, mas também em leis americanas ou inglesas ou chinesas e na orientação seguida por muitos catedráticos de psicologia, até hoje. Além do mais, o prazer veiculado em nossas sociedades é sempre uma escapatória para a culpa. Culturas que têm como figura icônica um Deus sofrendo na cruz costumam ter problemas com o prazer puro e simples -- principalmente o sexual, sem pretensão reprodutiva. Por isso, fazemos emergir o lado sombra dessas sociedades baseadas na necessidade do sofrimento. Despertamos seus demônios adormecidos. Elas adoram nos crucificar porque ousamos nos contrapor à crucifixão (e, às vezes, pervertemos a própria dor, ao substituir Cristo por São Sebastião -- aquele todo flechado, que suspira de amor).
Em resumo, para ela nós não temos conserto. E isso nos outorga uma grande vantagem: somos fascinantes objetos do desejo recalcado da sociedade. Enquanto formos proibidos, estaremos também encantando. Ou alguém duvida que quanto mais proibido mais desejado? É a lei da culpa. Há muito tempo a humanidade vem exorcizando através do horror ao nosso "desvio" seu próprio desejo de transgredir. Somos o espelho de sua transgressão, por nós atualizada. Quando a sociedade vai nos integrar? No dia em que formos suficientemente integráveis. E, repito: pagando um preço. Pense em quanto vai ser preciso dar em troca. Exercite sua imaginação: faça uma lista. No final, você verá que o Paraíso Social tem cara de papai-mamãe -- que poderá ser papai-papai ou mamãe-mamãe. Mas sempre se exigirá que a gente se coloque no nosso lugar, quer dizer, o lugar à margem que a sociedade nos ofereceu, sobretudo quando delimita nosso espaço. Porque lá é o lugar dos transgressores que somos, gostemos ou não.
Portanto, será preferível continuar criando Vida nessas inóspitas margens. Foi o que muita gente extraordinária fez. Foi o que Safo fez. Sócrates fez. Michelângelo. Tchaikovsky. Virginia Wolf. Pasolini. Marguerite Yourcenar. Mário de Andrade. É outra lista longa. Informe-se e faça a sua própria. Vai ser delicioso saber que você nunca esteve só -- parte do seu verdadeiro mundo, não daquele onde nos querem enfiar. E haja listas!


(Publicado na revista SUI GENERIS; julho/1997, nº 25; e como apêndice do livro DEVASSOS NO PARAÍSO, Ed. Record, 2.000)

Lorca


Federico García Lorca é, ao lado de Miguel de Cervantes, o escritor espanhol mais conhecido e lido tanto na própria Espanha, como no resto do mundo. Poeta e dramaturgo, de uma obra intensa, marcada por codificações simbólicas: a lua, a morte, a terra, a água, o cavalo, a criança...

Lorca criou um dos mais belos teatros do século XX, introduzindo em suas peças uma linguagem poética singular. Sua insatisfação diante da vida transformava os costumes abordados em sua tragédia. Centro de um grupo de intelectuais que passou para a história como a “Geração de 27”, congregou com os maiores nomes do universo da arte e cultura da Espanha do século passado, entre o solar dos seus amigos estavam: Luís Buñuel, Salvador Dali, Antonio Machado, Manuel Falla e Rafael Alberti.
Federico García Lorca foi um dos primeiros a ser vitimado pela Guerra Civil Espanhola, sendo abatido pelos nacionalistas, grupo liderado pelo general Franco, que uma vez no poder, levaria a Espanha a uma ditadura de quatro décadas. Durante a ditadura franquista, o nome do poeta andaluz foi banido e proibido em todo o país. Numa época de conservadorismo dos costumes católicos na Ibéria, as idéias de Lorca, juntamente com a sua homossexualidade latente, foram decisivas para o seu fuzilamento. Se a conduta de idéias e as assimilações de vida de Lorca bateram no preconceito de uma nação, assassinando o homem, o poeta e o dramaturgo eternizaram o mito. Mesmo calada a sua obra por décadas, ela voltou com os ventos da democracia, formando um grande vendaval que fizeram das palavras dilaceradas à luz da lua, um grito que ecoou por toda a península Ibérica, tornando-se um dos maiores nomes da literatura espanhola.



Tendências Musicais no Universo do Jovem Lorca

Federico García Lorca nasceu em 5 de junho de 1898, em Fuente Vaqueros, povoação próxima a Granada, na Andaluzia. Filho mais velho de quatro irmãos, viveu uma infância que marcaria para sempre a sua vida e, principalmente, a sua obra. Todas as vezes que questionado sobre o que escrevia, Lorca aludia à infância como fonte de inspiração. Sua família enriquecera com o negócio do açúcar, formando um núcleo de pequenos proprietários e funcionários administrativos. É na figura da mãe que o pequeno Federico mais se espelha, apesar da sua tendência para a depressão. É com ela que inicia os seus estudos e aprende as primeiras letras. A infância corre-lhe feliz dentro do seio desta família andaluz, que trazia homens que gostavam da vida boêmia e da música, e mulheres que liam Vitor Hugo como modismo.
O mundo da arte abraçou desde cedo “el niño“ andaluz, que se dedicava horas a tocar piano, numa demonstração clara de vocação para a música. Por algum tempo acreditou que o pai o enviasse para Paris, onde pretendia continuar os estudos musicais, mas com a morte de seu professor de piano, António Segura Mesa, não teve como convencer a família, que queria para o filho uma profissão mais “útil”.
Terminado o sonho de ser músico na adolescência, o jovem Lorca seguiu para Granada, matriculando-se em Direito e Filosofia. Sem aptidão para os cursos, logo deles se desinteressa. Concluiria com dificuldade o curso de Direito. É desta época o seu primeiro sucesso literário “Impressões e Paisagens”. É em Granada que começa a desenvolver o seu círculo intelectual, travando conhecimento com António Machado e Manuel Falla, estreitando com eles uma longa amizade.
Em 1919 Lorca seguiu para Madrid, para concluir o curso de Direito. As conturbações culturais assolavam a Europa, que acabara de viver os duros anos da Primeira Guerra Mundial. Era hora de refazer os escombros que a guerra deixara, inclusive o cultural. Sob os ecos do horror da guerra, tudo parecia finito, os ventos reluziam mudanças, os símbolos tomavam dimensões no jogo social e artístico, refletidos em Freud e Nietzsche, incitando códigos que respingariam na obra que o jovem García Lorca começava a traçar. Nesta época publica o seu primeiro poema na “Antologia de Poesia Espanhola”, e começa o projeto de um livro de poemas. O escritor matava de vez o músico. Os versos usurpavam as notas musicais, e o maior poeta da Espanha do século XX estava pronto.


Encontro com Salvador Dali


Em Madrid, por recomendação do amigo e antigo mestre, Fernando de los Rios, Lorca foi aceito na Residência dos Estudantes. O local era freqüentado por intelectuais, costumando receber palestrantes famosos, como H. G. Wells, Einstein, Paul Claudel, Bérgson, Paul Éluard, Louise Curie, Stravinsky e Paul Valéry.
Na Residência dos Estudantes, Lorca transforma o seu quarto em ponto de encontro de intelectuais e centro de longas tertúlias. É na capital madrilena que conhece Salvador Dali, Rafael Alberti e Luís Buñuel, que futuramente tornar-se-iam a mais fina flor de intelectuais espanhóis.
Do encontro de García Lorca com Salvador Dali surgiria uma grande amizade, movida por uma forte empatia. Se Lorca era um jovem sensível, de uma alma inquieta, Dali, não lhe ficava atrás, era um homem tímido, que se vestia de uma excentricidade perene. Se para Dali nascia uma grande e profunda amizade, para Lorca nascia algo mais, uma profunda paixão, cerceada pelos meandros sociais e pelos códigos morais que só eles ousavam decifrar além.
Se Madrid borbulha intelectualmente, também Lorca explode a sua obra. Estréia a sua primeira peça, “El Malefício de la Mariposa”, um ano depois de estar na capital espanhola. Apesar de ser sucesso de crítica, a peça é um fracasso, fazendo com que o autor volte-se para a poesia. Em 1921 lança “Libro de Poemas”, grande sucesso que o leva a publicar mais poesia. Nos três anos seguintes dedica-se a escrever várias peças e a elaborar outras tantas. Nesta fase descobre uma nova paixão, o desenho, que lhe rouba bastante do seu tempo.





Ruptura com Dali

O ano de 1927 é intenso para García Lorca. É nesta época que ele e o seu grupo de amigos passam a ser conhecidos como a “Geração de 27”. É o ano que estréia com a companhia da atriz Margarita Xirgú, de quem se torna grande amigo. Será para a amiga que Lorca escreverá, futuramente, as maiores personagens da sua obra teatral, como Yerma e Bernarda Alba.
Salvador Dali organizou, em 1927, os desenhos de Lorca, expondo-os nas míticas galerias Dalmau, em Barcelona. Logo a seguir, Lorca publicou aquele que se tornaria o seu livro mais famoso, “El Romancero Gitano”. O sucesso foi absoluto, sendo aplaudido por todos, aclamado o melhor livro na Espanha. Apesar de ser unanimidade, Luis Buñuel e Salvador Dali acharam o livro profundamente ruim.
A opinião desfavorável de Dali, emitida em uma carta que trazia um tom às vezes magoado, transtornara Lorca. Se a sua obra atingia com sucesso a Espanha, por outro lado Salvador Dali afastava-se cada vez mais. Lorca apercebera-se que Dali desenvolvia um interesse latente por Gala, mulher de Paul Éluard. Amargurado com a falta de solidariedade de Dali, Lorca entrou em depressão. Quando questionado, falava que era por problemas sentimentais por conta de uma desilusão amorosa. Por detrás da depressão, a verdade era só uma, o momento de ruptura com Salvador Dali.



Surge o Grande Dramaturgo

Se o momento era de conquista profissional, as perdas sentimentais eram irreversíveis, e Lorca deixa-se deprimir. É neste período que o antigo amigo e mestre Fernando de los Rios, com viagem marcada para os Estados Unidos, convida-o para acompanhá-lo. Lorca sabe que o momento é de rupturas, de transformações e ebulições interiores. Decide aceitar o convite do amigo e deixa a Espanha, partindo para Nova York.
Acostumado às tertúlias intelectuais de Madrid, aos salões culturais europeus, Lorca vê-se perdido e esmagado em Nova York. Rejeita tenazmente o olhar americano sobre a vida. Não só ele vivia uma depressão, como a própria Nova York explodirá a sua bolsa de valores, levando a recessão econômica para o resto do mundo.
Passada à primeira imagem depreciativa da cidade, e também a depressão por sua ruptura com Salvador Dali, Lorca abraçará Nova York com paixão. Entrará em uma grande fase criativa, escrevendo um ciclo de poemas que será agrupado sob o título de “Poeta em Nova York”, além da peça “Assim que Passarem Cinco Anos”.
Quando regressa à Espanha, Lorca entrega-se a um período de intenso trabalho. Ao lado de Eduardo Ugarte funda a companhia de teatro La Barraca. Encena vários dramaturgos espanhóis, percorrendo em itinerância com a companhia, várias regiões da Espanha. A partir de então, escreverá as peças que se irão compor as suas principais obras. Lorca mescla poesia e teatro em uma linguagem única, transformando a forma de encenação das peças nos palcos espanhóis. Sua dramaturgia é marcada pela obsessiva visão de que o desejo e o sexo são os fios condutores da vida e da morte. Lorca declararia que o público de teatro da época só tinha interesse pelos temas social e sexual, e que optara pelo segundo.
É neste contexto que o autor faz rupturas com o teatro burguês, enquadrando-o no seu misterioso mundo particular, jogando no palco a dolorosa e solitária visão da vida. É no palco que se despede dos amores impossíveis, da tragédia dos sentimentos escondidos em quartos clandestinos de amantes que desafiavam o mundo. Será assim em “Bodas de Sangue”, quando a mulher abandona o marido para seguir o amante, causando-lhes a morte; em “Yerma”, a esterilidade enlouquece a mulher, que termina por matar o marido; ou ainda, “A Casa de Bernarda Alba”, em que a defesa da honra caprichosa impede o avanço dos amores. Nas três tragédias, evidencia-se o autor diante do mundo, preso às impossibilidades sociais diante da sua forma de amar, à esterilidade que a sua homossexualidade o atira, e aos preconceitos que lhe irão, assim como na primeira peça citada, causar-lhe a própria morte.



Abatido Pela Guerra Civil

O último ano de vida de García Lorca é marcado por um fértil momento criativo e atividade profunda, quer como poeta, quer como dramaturgo. Neste ano estréia “Doña Rosita”, além de elaborar aquela que seria a sua última obra teatral acabada, “A Casa de Bernarda Alba”. A estréia da peça estava marcada para julho de 1936, mas alguns imprevistos causaram atrasos que empurraram a estréia para setembro. Por este motivo, Lorca seguiria para Granada para visitar a família.
Os tempos na Espanha traziam uma grande tempestade sobre a liberdade, atirando-a em uma trágica guerra civil.
Ingenuamente Lorca não acreditou que um conflito pudesse acontecer em seu país. Quando chegou a Granada, encontrou um clima tenso, pois a cidade tinha sido palco de alguns confrontos. Dois dias depois de ter chegado à terra natal, a guerra civil eclodiu.
A situação do poeta era delicada, suas posições políticas eram vistas com repúdio pelos conservadores direitistas, o suficiente para pôr a sua vida em perigo. Dias antes de regressar para Granada, subscrevera, a pedido do Comitê dos Amigos de Portugal, um abaixo-assinado em protesto à ditadura de Salazar. Sua homossexualidade era incômoda para os mais ortodoxos moralistas da época.
Sabendo que corria risco de ser morto, Lorca decide sair da Espanha, seguindo para o México, onde já estava a amiga Margarita Xirgú. Mas ele demora muito em executar o plano de fuga, em parte por ainda acreditar que o conflito talvez não se vá estender por muito tempo, ou por temer que a família sofresse retaliações. Por várias vezes teve a hipótese da fuga. Sejam quais forem os motivos, os questionamentos de Lorca naqueles momentos decisivos, a hesitação e demora em deixar a Espanha custar-lhe-ia a própria vida. Quando se sentiu acossado, Lorca refugiou-se na casa da família do poeta e amigo falangista, Luís Rosales. Estava decidida a sua sorte!
Um vulto negro surgiria na vida de Lorca, o sinistro Ramon Ruiz Alonso. Homem conhecido por ser um fervoroso católico, conservador e fascista, Alonso tinha um ódio natural por Lorca. Destacado para fazer a limpeza dos vermelhos de Granada, ele escreve um auto de denúncia contra Lorca, iniciando a sua caçada. Para Alonso, Lorca era “mais perigoso com a caneta do que outros com revólver”. O algoz inicia uma operação militar de captura a Lorca. As ruas foram fechadas, as casas cercadas e franco-atiradores foram postos nos telhados. Lorca foi preso.
Assustado, Lorca foi informado que Alonso decidira que seria executado. Ao saber do seu destino, Lorca chorou, fazendo um último pedido, que lhe fosse chamado um confessor, pedido que lhe foi negado. Solitário com os símbolos e as palavras que fizera da sua vida o sentido dos homens talhados para os mitos, Lorca passou a última noite de vida na prisão, a rezar, a esperar pela tragédia, vivida no seu próprio palco. Tão logo a lua, companheira eterna da sua obra, em quarto minguante, retirasse-se do céu, restar-lhe-ia a morte como sorte.
Logo pela manhã do dia 19 de agosto de 1936, Federico García Lorca, uma dos ícones da Espanha, foi levado da prisão pelos Nacionalistas do general Franco. Foi posto debaixo de uma oliveira e ali abatido com um tiro na nuca. Já no chão, ainda disse: “Todavia estoy vivo”. Foi quando um dos seus executores deu-lhe um tiro de misericórdia no ânus, porque assim deveria morrer os “maricones”.
Morto aos 38 anos de idade, García Lorca teve o corpo deixado em um ponto de Serra Nevada, em uma vala comum no barranco de Viznar, em Granada. Após o fim do franquismo, durante décadas a família de Lorca impediu que a vala onde o corpo foi deixado fosse aberta e o corpo exumado. Uma resolução do juiz Baltasar Garzón, de 2008, obrigou que a família voltasse atrás na sua decisão. Segundo o juiz, ali estão outros corpos de homens que também foram mortos pela guerra civil, e as famílias desses homens querem prestar-lhes uma homenagem justa e enterrá-los com dignidade cristã, o que era impedido pela recusa da família de Lorca.
O governo ditatorial de Franco tentaria explicar em vão a morte de Lorca diante da Espanha e do mundo. O assunto sempre foi tratado pelos franquistas com ressalvas e apontado como um lamentável acidente de guerra, já que Lorca era apartidário. Segundo os franquistas, o escritor caíra apanhado no turbilhão confuso dos primeiros dias de guerra. Se a morte de Lorca tinha sido um lamentável engano, como afirmavam, a proibição da encenação das suas peças durante o franquismo era uma realidade tenaz. Possuir livros do autor era considerado subversivo, trazendo perigo para quem teimava em ler o poeta andaluz. Mas a voz de Lorca ultrapassou a vala que seu corpo tinha sido atirado, cumprindo a profecia das suas palavras, que dissera anos antes de ser abatido: “Um morto na Espanha está mais vivo como morto que em nenhum outro lugar do mundo”.
Federico García Lorca, assim como as tragédias que escreveu, encerrou a vida dramaticamente, como mártir de uma sangrenta guerra que devastou a liberdade da Espanha. Em Granada ele encontrou a inspiração para a sua obra, a lua da Andaluzia iluminaria o palco das suas palavras. A mesma Andaluzia que lhe serviu de berço e de vala funerária, a mesma Granada que deu à luz e tragou um dos mais valorosos poeta e dramaturgo da literatura universal.

O destino libertário de Jean Genet






O autor de Querelle e Nossa Senhora das Flores encontrou no filósofo Jean-Paul Sartre, autor de Saint Genet – Ator e mártir, o intérprete ideal de sua transubstanciação da dor e da perversão em uma forma de exercício e escolha da liberdade.

Carlos Eduardo Ortolan Miranda

Divina: – De tanto repetir para mim que não estou viva, aceito o fato das pessoas não mais me considerarem. 
Jean Genet

O pária escreve uma poesia corrosiva, de acidez clássica, de beleza terrível. O pederasta, o ladrão, o mendigo, o enjeitado, o encarcerado prestes à condenação perpétua (como se esta já não lhe fizesse parte da alma) produz literatura. Nossa Senhora das Flores, Querelle, Pompas fúnebres, uma literatura que é física, mineral, poesia-objeto, poesia-corpo que só se refere ao concreto e que, por isso mesmo, nos alcança. Que é recusa e desprezo. Pecado mortal, decisão pela recusa e desejo de desespero. Não. Mais grave. Esperança no Mal. Santificação do estigma que lhe foi gravado com o ferro em brasa da acusação das Pessoas Honestas. Que nos atinge como um soco. Que alimenta nossos fantasmas mais íntimos. Literatura abismal, palavra que não liberta, Evangelho dialeticamente transmutado ou que, por outra via, descortina um salto de liberdade possível, necessariamente possível, que é inaceitável em sua sedução transgressora. A demonstração axiomática da liberdade humana é uma infâmia inconcebível. Exibir a essência ineludível da liberdade é o pecado original de Genet. E isso através de uma ordem rigorosa que é o lado oculto da ordem, é um cartesianismo às avessas, uma moral religiosa com sinal trocado. No jardim dos caminhos que se bifurcam, Genet escolhe a face escura da lua, os raios de um sol negro.
O condenado que recusa a história e assume o mito exibe impudente suas chagas, o vagabundo oficiante transubstancia a dor e a perversão. Pecado tão mais horrendo, pois sempre é inversão do dogma: sacraliza o ímpio e goza através do que é recusa social. Refina até o limite, com um racionalismo irretorquível, a face malévola refletida no espelho da reta via burguesa. Não é um simples sofista a exercitar habilidades discursivas para uma platéia de doutos, pois Genet não tem pares. A solidão fundamental é um estigma em sua própria carne. Jean Genet é um criador de palavras eficazes, no sentido mais grave do termo. Assassinos oficiam liturgias do crime, o carrasco excita o escritor onanista, o lirismo se produz por intermédio da realização poética do reverso da consciência burguesa, mas, e de novo, é a reafirmação do inescrutável que vem à luz, e que nela se incrusta. O verbo se faz carne, mas herética. A palavra hábil é litania, e torna a corrupção o canto sacramental na catedral dos marginais de Genet. Não gostaríamos de ouvir essa harmonia da perversidade que não é caos, pois o caos é ininteligível. O ladrão nos atira nas faces tranqüilas que a liberdade é inescapável. “Liberdade é maldição possível,  homens honestos”, diz-nos Genet: o silogismo assustador é que a opção pelo crime, pelo que há de obscuro e soturno em nós, realiza-se ao provarmos o fruto acerbo por meio do qual essa literatura expõe a neutralidade essencial do conceito de liberdade que agora nos assedia e se clarifica, ofertado pela voz agônica do excluído: está a nos espreitar sob as gravatas e os horários, repousa na paz dos lares, oculta-se sob a face da presumida inocência.
Jean Genet é um mistério. Jean Genet nos apavora.
É justamente o mistério representado pela contradição aparente (no limite, que poderia ser associada a mero preconceito ideológico) entre a grandeza da obra e o destino marginal de seu criador que desperta o interesse de Jean-Paul Sartre. Em seu grandioso ensaio de crítica da obra de Genet, que originalmente surgiu como introdução às obras completas daquele pela Editora Gallimard, Saint Genet – Ator e mártir (editora Vozes), o filósofo francês discorre, por mais de quinhentas páginas, sobre o mistério Genet. Num livro em que se entrecruzam de forma habilíssima e sempre percuciente os discursos teóricos da psicanálise, do marxismo e da fenomenologia existencialista, Sartre procurará interpretar essa literatura vigorosa e complexa; descobrir a escolha que um escritor faz de si mesmo, como escreve Sartre, é inegavelmente uma leitura existencial da obra de Genet, compreendida à luz do conceito sartreano de Liberdade.
Iniciei esse ensaio, terá certamente notado o leitor atento, por uma contradição: destino libertário soa, à primeira vista, como um oxímoro. Se o destino é determinação externa, influência histórica objetiva ou cadeia causal, seu conceito rechaçaria, de forma lógica, a liberdade. Liberdade é possibilidade de escolha, possibilidade da qual, segundo Sartre, não podemos escapar. Em certo sentido, nosso destino é a liberdade. Somos condenados à liberdade, escreveria Sartre. É esse precisamente o caminho percorrido pelo pensador em seu ensaio, ou seja, procurar demonstrar que Genet, por um ato de escolha, cria-se a si mesmo: como ladrão, como adorador do Mal e, por fim, como esteta e artista.
A literatura de Genet é uma permanente celebração do amor homossexual. Querelle, Nossa Senhora das Flores, Mignon, Gorgui, Divina, toda a galeria de personagens de Genet é composta por cafetões, travestis, adolescentes angelicais e másculos marinheiros, soldados e assaltantes que têm em comum a predileção pelas práticas homoeróticas. Nesse mundo particular, as mulheres quase não têm lugar, ou são senhoras de meia-idade, matronas ou cafetinas que se comprazem em realizar a fantasia edipiana psicanalítica ao acolher jovens amantes em seu leito (o comentário inescapável é que talvez todas sejam a mãe que Genet não conheceu e que o abandonou, definindo assim o primeiro de seus múltiplos exílios da normalidade).
Como escreve o próprio Genet, em Querelle: “Entre eles, apenas para eles, estabelecia-se um universo (com suas leis e relações secretas, invisíveis) onde a idéia da mulher estava banida.” Trata-se, portanto, de criar a mulher, ou seja, definir o papel passivo e feminino na relação homoerótica. Esse papel, Genet parece resguardar para si mesmo: ao lado dos homossexuais másculos, violentos e não efeminados, como Querelle (e mesmo este, num exercício de liberdade que confirmaria a leitura sartreana, rouba num jogo de dados com a intenção de ser sodomizado por um cafetão), há os fracos, emasculados, passivos, que são violados física e emocionalmente pelos anteriores; é neste campo preferencialmente que se localizam os afetos de Genet, num masoquismo de objeto que aceitou e interiorizou, em seu ser-para-si, a relação de objetivação de seu ser-para-o-outro (Sartre). Numa inversão (note-se que o termo já foi utilizado com freqüência para a qualificação da sexualidade homoerótica) da evidência do cogito cartesiano, a consciência de si de Genet perde seu caráter de autocertificação em detrimento do que ela é para os outros quando foi penetrada (violada?) pela acusação social de ser um ladrão, através da palavra vertiginosa que ouviu de seu pai adotivo, aos dez anos (tu és um ladrão!); antes desse acontecimento que teve papel de fundamento mítico de sua existência, Genet era uma criança religiosa, obediente e estudiosa. Ao aceitar a transmutação operada pela palavra do pai adotivo, tornou-se um ladrão, ao tomar como evidente o que era para os outros, e não sua percepção subjetiva. Descreve Genet em sua literatura essa experiência que foi a sua morte (e nascimento) ritual: “Perguntou a Lou por que ele roubara e ele só soube responder: – Porque os outros acham que sou um ladrão” (Nossa Senhora das Flores). A partir deste instante fundador, Genet torna-se objeto, e portanto, passivo. Passividade que se reflete tanto na inversão do papel sexual e adoção da feminilidade quanto na aceitação e interiorização do ser enquanto objeto.
A relação com a homossexualidade de Genet enquanto leitmotiv de construção formal encontra-se exposta de maneira paradigmática em Nossa Senhora das Flores, romance que é considerado a obra-prima de Genet e que Sartre julgava, ao lado do Ulysses de Joyce e da obra de Jean Giradoux, uma das “três grandes obras medievais do século XX”. Romance inteiramente escrito enquanto Genet estava no cárcere, toda a sua redação tem por função única o apelo ao desejo erótico de seu autor; Genet está preso e torna-se um onanista contumaz. Redige Nossa Senhora das Flores como estímulo às suas fantasias masturbatórias de solitário radical. Assim, a própria elaboração das personagens corresponde ao princípio formal de produzir excitação em seu criador. Genet identifica-se com Divina, personagem na qual projeta todo o seu masoquismo e desespero, porém ama os amantes de Divina, que não são outra coisa que estímulos de sua fantasia erótica. A criação das personagens, suas características físicas e psicológicas, não se funda em nenhum princípio realista ou de verossimilhança; pelo contrário, cumpre precisamente a função de ser, de forma realista, poderoso estímulo erótico para a imaginação masturbatória. Se, no interior do romance, os ciganos, cafetões e ladrões não cumprem sua função primordial de propiciar a ereção e o orgasmo do escritor encarcerado, ele simplesmente os alterará, confundirá suas características, ou cruelmente os punirá. Romance de catarse e expiação, exercício e expressão  de liberdade de um suicidado pela sociedade, na bela expressão de Artaud ao referir-se a Van Gogh, é através da redação desse romance impossível, improvável, que Genet realizará sua metamorfose final. É a partir de Nossa Senhora das Flores, desse delírio de fetichista tornado poesia, que Genet tornar-se-á artista.
O mistério de Genet resolve-se, portanto, de forma surpreendente, em uma radical consciência da liberdade. Genet estava condenado e morto, desde a palavra vertiginosa de seu pai adotivo. Não tomou as decisões lógicas e cabíveis, não escolheu o possível e razoável, que seriam o suicídio ou a pacificação da loucura. Genet escolhe viver e, do mais fundo de sua miséria e solidão, decide tornar-se escritor. Dando novamente a palavra a Sartre: “Só a liberdade pode tornar inteligível uma pessoa em sua totalidade, mostrar essa liberdade em luta contra o destino, primeiro esmagada por suas fatalidades, depois voltando-se contra elas, digerindo-as pouco a pouco (…) provar que o gênio não é o dom, mas a saída que se inventa nos casos desesperados, descobrir a escolha que um escritor faz de si mesmo, da sua vida e do sentido do universo”. Tal foi a escolha operada pelo destino libertário de Jean Genet.


Carlos Eduardo Ortolan Miranda
mestrando em filosofia pela USP