"Há sempre algo de ausente que me atormenta"
Esta carta faz parte do catálogo da exposição que a Pinacoteca do Estado de São Paulo, realizou em São Paulo, em 2006.
Querida Camille,
Organizando os meus papéis o mês passado, encontrei várias cartas suas endereçadas a mim. Reli-as; datam todas de 1905, ano em que organizei para você, em minha galeria, a exposição que entusiasmou a crítica, sem que, infelizmente! Quebrasse o gelo dos amadores.
Quanta coisa aconteceu depois! Sua partida, a guerra, a morte de Rodin, a doença que me manteve afastado de Paris até 1926…
Já não sabia de seu paradeiro…No mundo matreiro da escultura, Rodin, você, possivelmente mais três ou quatro, tinham introduzido a autenticidade, isto não se esquece. X. guarda ainda uma recordação maravilhada do seu mármore – A Suplicante - ( fundido por mim em bronze para o Salão de 1904), que ele considera o manifesto da escultura moderna.
Você era enfim “você mesma”, totalmente liberada da influência de Rodin, tão grande pela inspiração quanto pela técnica. A prova da primeira tiragem, enriquecida por sua assinatura, é uma das peças mestras de minha galeria. Nunca olho para ela sem experimentar uma indizível emoção. Parece até que a estou revendo. Os lábios entreabertos, as narinas palpitantes, essa luz no olhar, tudo isso grita pela vida no que ela tem de mais misterioso. Com você, íamos deixar o mundo das falsas aparências pelo do pensamento. Que gênio ! A palavra não é bastante forte. Como pôde você privar-nos de tanta beleza ?
Num dia em que Rodin me fazia uma visita, ví-o subitamente imobilizar-se diante desse retrato, contemplá-lo, acariciar suavemente o metal e chorar. Sim, chorar. Como uma criança. Faz quinze anos que ele morreu. Na realidade, ele nunca amou senão você, Camille, posso dizê-lo hoje. Tudo o mais – essas aventuras lamentáveis, essa ridícula vida mundana, ele que no fundo permanecia um homem do povo – era a válvula de escape de uma natureza de excessos.
Oh! Sei bem, Camille, que ele a abandonou, não procuro justificá-lo. Você sofreu muito por ele. Mas não retiro nada do que acabo de escrever. O tempo reporá tudo no seu lugar.
O que posso fazer agora por você, querida Camille Claudel?
Escreva-me, segure a mão que lhe estendo. Não deixei nunca de ser seu amigo.
Com minha afeição e respeito.
Seu Eugène Blot
3 de setembro de 1932
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