Na semana passada assisti ao novo filme de José Sette "Amaxon" exibido no Museu de Arte Moderna Murilo Mendes. Assim que cheguei em casa não me contive e escrevi um email ao Sr. Sette, ele este em JF para participar do "Diálogos Abertos" promovido pelo MAMM. Quando abro o seu blog, vejo que ele tinha publicado meu email...
Emeios Pertinentes
Recebi dois emeios que justificam a exibição do filme AMAXON no Museu de Arte Murilo Mendes em Juiz de Fora.
O Primeiro viu o filme o segundo leu o primeiro.
Sr. Sette,
Acabo de chegar em casa vindo da exibição do filme "Amaxon" em Juiz de Fora e este filme ainda não saiu de mim, uma experiência fantástica.
Filmes como este me fazem pensar que um verdadeiro cinema preocupado com a estética e a linguagem cinematográfica pode ser feito, me faz ver que existem outros caminhos, porque é tanta coisa que as vezes nos fazem desanimar.
Seu filme reviveu em mim o sentimento de pensar no cinema como algo sagrado e verdadeiro, imagens vivas, de um diretor vivo e ativo, produzindo... por muito tempo eu achava que o cinema bom já tinha sido feito... que os bons filmes ficaram no passado... o poder daquelas imagens me fez pensar muito em relação ao meu sentimento pelo cinema... Mesmo com poucos recursos, o verdadeiro cinema transcende qualquer técnica quando se tem amor e em cada momento daquele filme pude ver o amor que você sente pelo cinema.
Daiverson
Caro José,
Euclides da Cunha diria que esse Daiverson, "saído da multidão anônima, surgido não se sabe donde", é, nada mais, nada menos, que a voz da História.
São assim os troféus da História, modestos, singelos, sem pompas, mas, acima de tudo, verdadeiros.
Assisti este filme ontem e ainda não consegui digerir todos aqueles elementos e força expressiva. Como ainda não consegui falar sobre, usurpo palavras alheias que tratam deste belo filme.
Um longa metragem experimental, filmado em 1975, sem história, sem roteiro, sem sinopse, guiado apenas, durante os sete dias de suas filmagens, pelo que era o sentimento da vida, naquele momento opressivo, paranóico, obsessivo, vividos pelos que se sentiam perseguidos. Uma metáfora sobre o conflito ideológico e político do país passado entre a ação e o pensamento conservador de direita, contra uma esquerda que é neurótica, autofágica e confusa. Um filme alegórico sobre a perseguição, a repressão e a desumanização do povo brasileiro pela ditadura militar.
MARÉ TÁ CHEIA!
Era quando o “doce” ainda era “ácido” e os conjurados se reuniam no pier de Ipanema. A mordaça era dupla (e a que apertava mais, podem crer, era a stalinista) e nossos ouvidos eram detonados a “telefonemas”. A saída dos caretas era fazer tudo de uma vez e o mais rápido possível, afinal anunciavam e garantiam que o mundo ia se acabar. Para nós, se acabasse, que importava? Outro melhor, muito melhor, estávamos construindo, pelo menos em nós mesmos, em meio àquela bandalheira infernal.
Foi ele (o que se acabava e de fato se acabou, e no qual hoje em seu entulho vivemos) que o olho-de-peixe do inconfidente José Sette (José de Barros em 78), um pouco à maneira do kino-glass de Dziga Vertov, um pouco ao “Limite” de Peixoto e bastante à sua própria e confidencial maneira, no momento exato da sua derrocada final, registrou em película 35 P&B.
Porém os náufragos de “Bandalheira Infernal” naufragam no asfalto, nos apartamentos de classe média, no trânsito corrosivo das metrópoles, nos morros e florestas da paisagem mágica do Rio de Janeiro, e vivem sempre perseguindo as suas próprias sombras e por elas continuamente sendo perseguidos. Cada quebrada, cada esquina, é a esquina do medo; o medo permanente e neurótico do inesperado, do incerto, do inseguro, o medo, enfim, de si mesmos, de sôfregos penitentes e derradeiros personagens de um mundo que rolou ladeira abaixo. - Mamãe!... O contraponto deste erro cósmico-kármico-pequeno-burguês, tão bem fotografado neste filme, no ato exato de sua cômica tragédia, e que nos exibe o retrato editado e falado daquilo que até hoje nos faz penar neste paraíso em plena América do Sol, do Sal, do Sul, vem na linguagem libertária do seu discurso cinematográfico,na postura irreverente da sua dramaturgia, na poesia hermética da sua criação, e, principalmente, na revelação de uma nova direção de cinema e de um estilo novo; um estilo de cinema-plástico, gráfico e contemporâneo até a alma. Vejam-no agora na tela: “o antigo que foi novo é tão novo como o novo mais novo”. Navegarbrasiliaterra.
Sim, leitor, estamos falando de Arte, sacou? Arte Maior! Biscoito fino, diamante legítimo, coisa rara, muito rara mesmo, nessa atual maré cheia de mediocridade. Algo para os (não poucos, mas raros) que sabem onde encontrar a essência da beleza e senti-la em toda a sua intensidade. Por isso que malandro (aquele que tem olhos livres e vê) tá sabendo que quando maré tá cheia é melhor entrar na areia. Porque na areia tem mais peixe que no mar.
Encontrei essas fotos no blog do cineasta José Sette (www.kynoma.blogspot.com), Maria Gladys é a minha grande musa, minha atriz preferida e figura mais interessante da contracultura dos anos 70. Este fim de semana assisti elas em dois filmes dentro da programação do "Cineclube Bordel sem Paredes" em "Sem Essa Aranha" de Rogério Sganzerla e "Bandalheira Infernal" de José Sette. Maria Gladys está assombrosa em "Sem Essa Aranha", depois assistir a este filme na sala escura e na tela grande, sai tonto, meio louco, uma experiência extrasensorial, como pode um ser humano conseguir realizar uma viagem tão tocante como a que vi? Abrindo "Bandalheira Infernal" ela também mostra que é mesmo a nossa grande atriz, seus olhos, seus gritos.
Pirei com esse clássico do cinema trash ou b ou cult ou seja lá o que for. Independente de qualquer definição, é maravilhoso o deboche que este filme é, com cenas politicamente incorretas, muito sangue, efeitos especiais toscos e muitas gostosonas peladas.
Um filme super divertido que chama atenção exatamente por não ser mais um filme caro e sizudo feito pelos grandes estúdios de Hollywood e sim pela Troma a super produtora de filmes desse estilo, que tem como nome principal Lloyd Kaufman.
Melvim, é constantemente humilhado pelos fortões e loironas da academia onde é faxineiro, entre eles um assassino chamado Bozo, que sai de carro pra matar criancinhas indefesas para aliviar seu estress.
Quando Melvim cai dentro de um barril de lixo tóxico, ele se transforma no Vingador Tóxico, passando a perseguir os bandidos de Tromaville.
Excelente, diversão garantida, preparem-se para muitas risadas!
Versão definitiva na minha opinião, para o clássico de Goethe. A história do homem que faz um pacto com o diabo com cenas surreais, mistura de ópera e teatro de marionetes, filme que ganha novas cores nas mãos do diretor Svankmajer. O diabo marionete rouba a cena de qualquer ator de carne e osso.
O interessante nos filmes de Svankmajer é que os seres humanos são filmados em stop motion, seus movimentos são artificiais, o que provoca uma estranheza ainda maior na forma como lidamos com aquele mundo proposto pelo diretor.
Filme político de Godard, onde um grupo de jovens reunidos em um apartamento em Paris, refletem suas preocupações políticas esquerdistas inspiradas pela doutrina de Marx e Lênim, com a revolução cultural acontecendo na China. Filme que antevê as idéias revolucionárias que tomariam as ruas de Paris no Maio de 68. Tem sua importância, mais dormi em algumas partes, porque aqueles discursos políticos cansam. Gostei da música que tem como refrão o nome do líder Mao. Juliet Berto, que logo depois desse filme seria papada por Glauber Rocha, está linda, super sensual.
Download em RMVB - Tamanho 298 - Legendas embutidas
Mais um excelente e muito doido curta de Suzan Pitt, repleto de psicodelias, cenas lisérgicas e surrealistas com traços belíssimos.
Uma mulher deprimida a beira do suicídio, a morte na banheira que inunda a casa toda, os bichos e insetos que brotam de seu corpo.
Um ratinho parecido com Mickey Mouse que cresce e fica gigante, um rádio ligado tocando músicas que celebram a vida como "What a wonderful world".
Pura inspiração a cena final onde a protagonista encontra a felicidade, debruçada na janela com olhar terno, barulho de carros passando, cabelos esvoaçantes.
Ainda não achei o filme todo pra download, mais assim que eu achar posto aqui
Este documentário do grande mestre dos documentários, o cubano Alvarez, acompanha o líder Fidel Castro em uma visita ao camponês Salustiano Leyva, testemunha viva do desembarque dos patriotas José Martí e Máximo Gómez que deram inicio a Guerra da Independencia, quando ele tinha apenas 11 anos.
Alvarez dá um enfoque super interessante, dando destaque para as relações de poder e a admiração de Salustiano e Fidel. A conversa dos dois é intercalada por trechos do filme "Páginas del diario de José Martí", de José Massip, trilha sonora super bonita em momentos onde o diretor explora a imagem de Salustiano.
Este documentário é muito divertido, mostrando de forma bem humorada a vida de prostitutas da terceira idade que se prostituem no Parque da Luz em São Paulo. A excelente montagem do filme faz com que cada depoimento das cinco senhoras entrevistadas pareça um bate papo de todas. As histórias são bem parecidas, da trajetória que fez com que cada uma entre para a prosituição aos relatos dos clientes com suas taras e desejos, fazem o espectador refletir sobre uma realidade que nunca antes tínhamos imaginado.
Stan Brakhage, cineasta capital para o cinema americano (e mundial) centrado nas formas não-narrativas, é um dentre tantos importantes nomes cujo acesso mais sistemático à obra nunca nos foi permitido no Brasil antes das possibilidades do cinema achado na internet. Esse texto se funda num recorte sobre sua obra: os filmes nos quais o documento mobiliza a representação artística, em que a criação se exerce sobre imagens tiradas da vida real (por mais complexa que seja a dimensão do conceito de vida).
O documento para Brakhage não é um simples registro a ser representado, mas a plataforma de uma reordenação fantasmagórica dos dados do mundo,uma subtração do sentido à dimensão naturalista e sua conseqüente inserção na ontologia. Uma coisa é fazer o que se chama genericamente cinema abstrato, avant-garde ou qualquer outro termo genérico do tipo, em cima de conceitos, estruturas, princípios a priori. Difícil é dar conta da massa indiscriminada das impressões do mundo real e submetê-la aos padrões de uma conformação conceitual e estrutural, como Brakhage intenta nesses filmes, nos quais a opacidade do real oferece a resistência típica a qualquer alteridade. Ou seja: imprimir o selo da subjetividade sobre um mundo irredutível a ela.
Stan Brakhage filmou nos anos 70 um conjunto de filmes chamado de trilogia de Pittsburgh, cujo propósito mais evidente era a documentação de três instituições da cidade: o hospital, a delegacia e o necrotério. The Act of Seeing with One’s Own Eyes (ao lado) é o filme que se centra nas atividades do necrotério de Pittsburgh. Uma coisa que sempre me impressionou, não apenas nesse filme, mas em outros como Window Water Baby ou Dog Star Man, é o poder alquímico de Brakhage em transformar dados de uma concretude inassimilável em estudos altamente sofisticados sobre relações espaciais e temporais, cores e texturas.
Em um filme como The Act of Seeing with One’s Own Eyes, particularmente, essa operação adquire os contornos semelhantes à arte de um Francis Bacon, que reflete em suas telas a realidade e a re-apresentação da realidade em um mesmo traço, de modo que o caráter grotesco da segunda enforme a primeira em uma diapasão monstruosa. A contundência das imagens do filme nos coloca diante de um sujeito que não se situa no nosso sistema convencional de percepção do mundo: ele desmistifica nossa representação e, ao mesmo tempo, revela o que subjaz a ela. De que maneira estamos próximos e irremediavelmente distantes do homem que se expõe ali?
Tecnicamente, o ritmo da montagem, o trabalho com a textura da imagem, o contraste entre a precisão didática de uma parte e o tom de diatribe expressionista de outra são modos que o cineasta utiliza para situar o espectador em uma estranha dialética de identificação e estranheza. Nesse filme, o paradoxo fecundo da arte de Brakhage vem à tona de forma radical: trabalhar de tal forma o símbolo de maneira que nele sejam deflagradas forças que destruam todo o seu potencial simbólico. A partir do símbolo, temos o acesso a uma experiência primitiva, inconsciente que arrasa o próprio sentido da simbolização.
Historicamente, fala-se numa grande influência do expressionismo sobre a obra de Brakhage, sendo os seus primeiros trabalhos colocados sob o signo de um psicologismo um pouco naif. É bom lembrar que o conceito de expressão como fundamento da arte, inerente ao expressionismo, é recente, e se identifica com o romantismo; implica a concepção do homem como mônada fechada em si mesma, irredutível ao mundo, abrindo-se para ele e nele. Seu fundamento está na subjetividade romântica. O classicismo nunca conheceu a vivência correspondente ao princípio moderno de expressão.
Ora, o expressionismo é uma arte que testemunha a decadência da subjetividade, o impasse da expressão num homem coisificado, que não se vê refletido nas obras que cria: o mundo moderno, com seu quociente de alienação e reificação, favorece essa dislexia. O homem alienado, estranho ao meio que o situa e às obras deste mundo, só consegue exprimir a fantasmagoria de sua condição. Este é o homem visado pelo expressionismo; um romântico “sem lugar neste mundo”, alguém que é detentor da possibilidade de expressão sem, no entanto, conseguir acoplar a ela conteúdos legítimos, reais. O expressionismo pode ser considerado, assim, como a experiência de um mundo sem experiência. Um mundo no qual o sujeito, detentor da experiência, não mais se reconhece no mundo, tributário da vivência. É como se a forma permanecesse, mas como uma casca oca, sem corresponder a nenhuma realidade ontologicamente legítima.
A obra de Brakhage me parece radicalizar esse dilema. Num mundo no qual a expressão (como atributo de um sujeito que representa o mundo, logo ainda tem contatos com ele) perdeu todo sentido, o artista insiste em afirmá-la. Em exprimir. Mas esta afirmação é aureolada de negatividade; ela expõe a sua própria impossibilidade. O que resta a ser expresso é a ruína de toda expressão. Assim como no caso do expressionismo, o sujeito e o objeto permanecem lá, mas envoltos em correntes de forças e relações temporais que subvertem completamente a sua posição originária.
A passagem da pintura figurativa ao abstracionismo conheceu esse mesmo processo histórico de rarefação e liquidação da subjetividade. Fragmentos, despojos, rastros, traços. A montagem alucinada e o caráter de fluxo da ligação entre os planos expõem um sujeito inteririço, disperso, atomizado. Brakhage pratica uma estranha – e cada vez mais corrente – modalidade de romantismo, a consagração da ruína do sujeito como o único ritual que é dado ainda à subjetividade celebrar.
O que é o princípio de fluxo de forças, adotado pelo artista na sua representação do mundo exterior, senão a atomização do objeto – e do sujeito – numa dimensão na qual eles não possuem mais a função assignada no universo cognitivo clássico? Na qual tanto o sujeito como o objeto se reduzem a forças imantadas por um campo de atração e repulsa, coação e refugo: Os corpos escalpelados de The Act of Seeing with One’s Own Eyes são, literalmente, a máscara expressionista dessa abdicação do sujeito ao seu trono convencional. O hieratismo celebrado ali é o mesmo que preside aos rituais trágicos: máscaras que escondem máscaras, ritos de exorcismo para abismos que “não ousam dizer o nome”. Trata-se uma subjetividade que se alimenta de sua própria fratura, de um ideal de expressão subjetiva que se constitui de seus próprios despojos. Seria essa a única forma de exposição da subjetividade num mundo – o pós-moderno – que não encontra mais lugar para ela? Subjetividade como ruína, como monumento fúnebre?
O estigma de um sujeito fragmentado aparece inclusive em um filme como Window Water Baby, aparentemente um ritual de celebração da vida familiar, visto que se trata da filmagem do parto da mulher do artista, em 1962. No entanto, presenciamos um ritual de despersonalização que se parece muito com o efetuado no filme sobre as autópsias. Do pai e da mãe, não vemos propriamente corpos, mas partes de corpos, superfícies onde a luz incide: a vagina é um pedaço de carne intumecida e violácea. Assim como The act..., não se trata de estruturas propriamente humanas; vemos volumes, relações, intuímos profundezas, texturas.
Corpos são totalidades significativas, orgânicas, e são o fundamento de qualquer identidade; ao mostrar fragmentos de corpos, e a rarefação destes fragmentos sob o efeito da luz e da montagem, Brakhage nega a noção de identidade tributária a um corpo. Os corpos e suas relações permanecem presentes, mas como rastros de um ideal de representação inacessível ao homem de hoje.
Para a subjetividade fraturada do neo-expressionista que é Brakhage, restam os destroços de um corpo pleno, total; a única totalidade a que ainda pode aspirar o corpo humano (e este é o passo além dado pelo artista em relação ao expressionismo e seu romantismo mórbido) é a integração do corpo (e do homem) num mundo outro, sugerido ali pela forma onipresente, imanente da água. A dissolução dos corpos numa instância que os ultrapassa (no caso, uma certa estilização da Natureza como cosmo e de identificação do homem com este cosmo) é a única maneira de afirmar a presença deles; como presenças em uma conjuntura na qual a presença se reduz a um traço rarefeito no horizonte do mundo.
A própria duração dos filmes denuncia o esforço; um longa-metragem, à semelhança do romance, descreve uma espécie de “épica do sujeito”, a trajetória de sua formação, desenvolvimento, coroamento. A intensidade e a curta duração da maior parte de seus filmes interdita o acesso a qualquer possível ascese do sujeito, e o relega ao papel de coadjuvante em um campo de forças sísmico e diferencial. A obra de Brakhage, niilista e utópica, reflete os impasses da representação do homem num mundo no qual as regras de identidade e diferença foram substituídas por estratégias de deslocamento e fluxos; se ela se recusa a nos dar respostas, o que é próprio da obra de arte, ela irisa nossa percepção e mobiliza nossa vontade com as forças históricas mobilizadas nesse processo.
A imitação;
A produção, a cópia mecânica;
E, por fim, a terceira fase: a simulação, onde interagimos com representações/símbolos/imagens/ícones, achando que é o original.